19 março, 2013

Sugestões para aproveitamento de popularidade

por Denise Queiroz


Acabo de dar uma geral na geladeira. Entre tomates e alfaces atacados por alguma bactéria, aqueles pedacinhos da ponta do pão fatiado dentro dos sacos, potinhos de vários tamanhos com uma colherada que alguém deixou de servir por educação, umas cinco fatias de queijo, cada uma na embalagem, empurradas para trás para dar lugar a outra coisa, sobrou o lixo cheio e a constatação do desperdício.

É uma constante o desperdiçar. Aí vejo aqui no twitter muito festejo pela popularidade da presidenta. 79% aprovarem o modo de governar é um feito, sem dúvida. Vão chover análises pró e contra de quando, como e por que essa senhora, que nunca tinha sido eleita antes, conseguiu a façanha.

Claro que esses 79% todos não vão se converter em votos em outubro de 2014. Estimando-se que uns 60% (sendo que 50% mais 1 voto é suficiente para dar a legitimidade exigida) desses que confiam, votem, é uma vitória mega incontestável. E por esse raciocino, estão sobrando 19%, que não devem ser desperdiçados.

Na linha de evitar o desperdício, que tal se esse capital de popularidade fosse convertido em ações de mudanças estruturantes?

Desde que o jesuíta Francisco foi escolhido papa, tenho estudado um pouquinho mais do já sabido sobre os Jesuítas. Para sintetizar, e omitindo as críticas, o grande mérito da ordem foi, lá em 1500 e poucos, ter entendido que o poder da igreja católica, naquele momento ameaçado pela reforma e pelo renascimento, só se manteria se ‘a palavra de deus’ fosse levada por eles a toda terra. Com todas as críticas que tenhamos a eles, é tão incontestável que atingiram seu objetivo que, hoje de manhã, 130 delegações de países prestigiaram a posse do Francisco. Entenderam eles, lá em 1.500, que não poderiam mais conter o conhecimento dentro dos castelos e mosteiros, mas que poderiam orientar, do seu jeito, a forma como o conhecimento seria apreendido. Ou seja, mudaram as cercas de lugar, deram mais campo para as ovelhinhas, e sempre cuidaram dos limites.

Podemos ficar mais perto. Na Venezuela, desde 1999, quando Chávez assumiu a presidência, uma das primeiras medidas foi mexer nas bases da educação e, passados 14 anos, temos profissionais atuando, universitários formados sob essa mudança, o ensino público fortalecido e uma população que tão cedo não vai aderir a projetos que mudem essa realidade.

Aqui, no governo Lula, tivemos evolução ‘que nunca dantes’ no ensino superior e o condicionamento do recebimento do bolsa-família à freqüência escolar dos menores beneficiados, certamente é um avanço, e como os tais 79%, incontestável. Mas falta, e muito. Apesar de sermos uma república federativa, cada estado define como vai cumprir o currículo básico do ensino fundamental. É uma salada de mau gosto. Sou testemunha de que isso é um erro, pois filhos de pais que têm que mudar constantemente acabam ora repetindo, ora ficando sem ter um conteúdo. Sem falar nos professores desvalorizados, mal treinados... 1% da popularidade poderia ser aplicado nisso e rapidamente seria multiplicado por um número maior.

Em outras áreas, como a reforma agrária, também os dados não são os melhores. Ainda há muitíssimas famílias sem terra e vivendo em condições subumanas à beira de estradas, em acampamentos improvisados. E mais um inverno chegando. Talvez ações de assentamento imediato consumissem uns 5% mais dos tais 19% sobrantes, e que seriam recuperados em credibilidade junto aos movimentos sociais, que sempre apoiaram o partido da presidenta.

Depois da educação, outra área fundamental para a formação cidadã, é a comunicação. Por mais que saibamos que é um ninho quase impenetrável, sabemos também que, do jeito que está, os milhões que estão saindo da miséria e entrando no mercado de consumo estão sendo seduzidos pelas benesses do consumo, o que inclui o lixo cultural (jornalismo, programas de auditório, novelas, enlatados) vendido 24 horas pelos canais, rádios e jornais. E nem entremos na análise dos conceitos que vem atrelados.

A indústria cultural gera riqueza, claro. O lixo vendido como moda e conceito de bem-viver (vestimenta, decoração, alimento, moradia, carro, loja, etc), movimenta desenhistas, agências de publicidade, fábricas, mão-de-obra de todas as especialidades.

Sinceramente, não creio que a presidenta, e seus assessores, farão alguma reforma profunda nessa área. Mas bem que poderia aplicar os ainda restantes 13% de popularidade - que não são necessários para a reeleição - em começar a mexer. A primeira medida, seria reduzir a propaganda oficial nos grandes meios e distribuir melhor essas verbas.

Se com a tecla de ‘governo ruim’ batendo dia e noite os 79% de aprovação foram alcançados, não creio que precise de mais provas de que essa propaganda é absolutamente descartável e que uma geração de pessoas melhor informadas – o melhor capital que um país pode ter - pode começar a ser gerada.

Mesmo se todos os 13% fossem aplicados nisso e o desgaste gerado pudesse por em risco a reeleição, facilmente se recuperaria, só pelo fato de ampliar a credibilidade junto a setores que, a cada dia mais, tendem a duvidar do caminho em curso, exatamente pela falta de movimento nas estruturas que sempre beneficiaram a oposição. 


Um comentário:

  1. Ah, se essas sugestões se tornassem realidade, o Brasil avançaria um milhão de vezes mais.

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