29 novembro, 2012

Hoje eu acordei menor

por Jonas de Carvalho
do Deu Saúva no jardim




Hoje eu acordei menor. Não por atitudes pessoais ou por gestos meus que diminuam meu caráter ou minha dignidade.

Sinto-me menor em importância para o meu país. Dei-me conta, não de uma hora para outra, mas de um processo aplicado por conta-gotas, de quão sem importância é o conjunto dos cidadãos para a nação brasileira.

E aqui se entenda “nação” como uma das definições que ensina o Aulete: “ Comunidade política autônoma e de território definido que partilha instituições comuns (constituição, governo, sistema judiciário)."

A contradição existente nessa definição e a realidade que vivemos é que me faz menor. Nós, os cidadãos brasileiros, exceto umas poucas centenas, não partilhamos instituição nenhuma. Não usufruímos da proteção da Constituição, a nossa partilha de Governo se dá apenas em momentos pontuais quando somos convocados a votar e menos ainda existem portas abertas para nós do sistema judiciário.

Junto com o incômodo da pequenez fica a imperiosa, mas nunca satisfeita curiosidade – e necessidade! – de saber por quais subterrâneos passam as decisões da nossa Republica, decisões essas, apenas para falar das mais recentes, que vão desde a estranha coincidência do calendário do STF que fez acontecer no mesmo periodo o julgamento de políticos de um partido com as eleições, até a volta de 180 graus que fez o relator da CPMI que leva o nome de um bandido, a retirar nomes de possíveis envolvidos na bandidagem poucos dias após a divulgação inicial de um relatório em que, de maneira contundente, refere-se a esses mesmos nomes assim: “Há provas de que políticos abriram seus gabinetes para os criminosos, jornalistas venderam matérias e empresários apoiaram e contaram com o apoio de membros da quadrilha.” Ou ainda quando diz a respeito do Procurador Geral: “apuraram-se fortes indícios de desvios de responsabilidade constitucional, legal e funcional, praticadas pelo Dr. Roberto Gurgel”

O que aconteceu entre o anuncio e a aprovação final deste relatório. Porque acusações tão serias tornaram-se dispensáveis? Onde está a leviandade? Antes ou depois? Mas que ela existe, existe.

Junto a essas suspeitas providencias e atitudes de todos os que no seu dia-a-dia escrevem a história política, administrativa e judiciária do Brasil, destacam-se ainda a de nossa presidente da republica juntamente com seu principal apoiador, o Lula, que em um silencio sepulcral e assustador, eximem-se de qualquer providencia – não há uma única providencia ou comentário! – que permita prever que o fim dos conchavos espúrios está próximo. Comigo não! Dizem os dois, afastando-se descaradamente da responsabilidade de assumir um lado, de preferência o lado dos cidadãos.

Pelo contrário a previsão é de mais convivências criminosamente obsequiosas entre todos os que militam na política brasileira, de um troca-troca sem fim em busca de um bem estar entre eles, uma convivência protocolar, porém danosa, um certo welfare state exclusivo que marginaliza os que verdadeiramente pensam e tentam construir um Brasil mais rico, justo e solidário.

Não entendo mais o PT, nunca entendi a imprensa, nos últimos tempos deixei de respeitar o judiciário e não me preocupo mais, como aliás pouco me preocupei sempre, com o papel dessa oposição oportunista e falastrona que poderia contribuir muito com um projeto de Brasil grande, mas limita-se a maquinações que empacam qualquer proposta para fazer o país caminhar para frente.

Não duvido que tenha havido maquinações e ameaças escabrosas e nada recomendáveis para que o relatório da CPMI com nome de bandido chegasse ao triste fim que chegou. Uns e outros livraram suas caras e suas peles em nome de qualquer coisa, menos no nome do país e de seus cidadãos. Entre estes, eu mesmo.

Nosso querido Brasil tornou-se a Republica dos Julgamentos e das Acusações Sem Fim e, para tanto, montou-se a Junta Conciliatória das Maracutaias e o Imenso e Primordial Cartório de Registro dos Contratos de Acordos e Conchavos com endereço na Sala Um do sub solo da Esplanada.

Desculpem-me a tímida tentativa de fazer humor com coisa tão séria, mas talvez isso seja apenas um disfarce para que eu não sinta o verdadeiro peso de tudo que sinto agora inclusive da minha consciência política.

22 novembro, 2012

A CPMI de Cachoeira e o papel da mídia


Gutenberg e a impressora/ renaissanceconnection.org

por Luis Nassif
O papel moderno da imprensa, no mundo, tem dois divisores de água.

O primeiro, legítimo, o episódio Watergate, no qual um jornal (The Washington Post), com um jornalismo rigoroso e corajoso, logrou derrubar o presidente da República da maior Nação democrática do planeta.

O segundo, tenebroso, o processo ao qual foi submetido o magnata da mídia, Rupert Murdoch, depois de revelados os métodos criminosos do seu tabloide, "The Sun", para obter reportagens sensacionalistas.

O crime do The Sun foi ter se envolvido com baixos e médios escalões da polícia para atentar contra o direito à privacidade de cidadãos ingleses.

***

O relatório da CPMI de Cachoeira, traz dados muito mais graves do que os crimes do "The Sun". Mostra ligações diretas entre jornalistas e o crime organizado.

A acusação maior é contra a revista Veja e seu diretor em Brasília, Policarpo Jr. O relatório mostra, com abundância de detalhes, como Policarpo era acionado para derrubar autoridades e servidores públicos que incomodassem Carlinhos Cachoeira, atacar concorrentes do marginal e como encomendava dossiês a ele, muitos obtidos por métodos criminosos.

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Já em 2008, a série "O caso de Veja" - que publiquei na Internet - mostrava os resultados dessa parceria.

Um esquema aliado de Cachoeira havia sido afastado dos Correios pelo esquema Roberto Jefferson. Jairo (o araponga de Cachoeira) armou um grampo em cima de um diretor, Maurício Marinho, recebendo propina de R$ 3 mil. A gravação foi entregue a Policarpo, que a considerou insuficiente. Providenciou-se outra gravação, aprovada por Policarpo.

Divulgado o grampo, caiu toda a estrutura montada por Jefferson e entrou a de Cachoeira. Veja compactuou com o novo grupo, mesmo sendo Policarpo conhecedor íntimo do esquema criminoso por trás dele.

Dois anos depois, a Polícia Federal implodiu o novo esquema. E a revista manteve-se em silêncio, preservando Cachoeira.

***

Nos estudos sobre as chamadas OrgCrim (organizações criminosas), em nível global, identificam-se braços nos três poderes - Executivo, Legislativo e Judiciário - e também na mídia. O relatório descreve bem as funções da organização de Cachoeira no país.

Cachoeira ajudou a eleger o ex-senador Demóstenes Torres. Veja transformou-o em uma figura política poderosa, com sucessivas matérias apontando-o como o paladino da luta contra a corrupção. Com o poder que se viu revestido por Veja, Demóstenes transitava em repartições, junto a Ministros do Supremo, aumentando o poder de lobby da quadrilha de Cachoeira.

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Veja é um ponto fora da curva no jornalismo brasileiro. Mas não ficou sozinha nessa parceria com o crime.

Um levantamento sobre as premiações do jornalismo investigativo nas últimas décadas vai revelar como fontes, em muitos casos, lobistas e criminosos da pior espécie.

Não apenas isso. Poderiam ser utilizados como fonte e suas informações servirem de ponto de partida para investigações mais aprofundadas. Mas eram utilizadas a seco, sem passar sequer pelo teste da verossimilhança, sem nenhum filtro, fuzilando reputações e, principalmente, atentando contra o próprio exercício do jornalismo.

Arquivo de coronel assassinado comprova que Rubens Paiva esteve no Doi-Codi

Devido à relevância do fato, excepcionalmente colamos aqui excelente matéria da Zero Hora .

Papel comprova que ex-deputado federal esteve preso antes de sumir/ Foto: Agencia RBS
José Luis Costa
joseluis.costa@zerohora.com.br

Um dos papéis mais procurados de um período sombrio da história do Brasil, uma folha de ofício amarelada e preenchida em máquina de escrever datada de janeiro de 1971, está guardado em um cofre do Palácio da Polícia Civil, em Porto Alegre. O documento confirma o envolvimento direto do Exército em um dos maiores enigmas do país protagonizado pelas Forças Armadas, cuja verdade é desconhecida até hoje.

É, até então, a mais importante prova material de que o ex-deputado federal, engenheiro civil e empresário paulista Rubens Paiva, desaparecido há 41 anos, vítima-símbolo dos anos de chumbo, esteve preso no Departamento de Operações e Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) no Rio de Janeiro, um dos mais temidos aparelhos de tortura do país.

O corpo de Paiva nunca foi localizado, e o Exército jamais admitiu responsabilidade sobre o sumiço do político cassado pela Ditadura Militar (1964 a 1985). Durante quatro décadas, o documento fez parte do arquivo particular do coronel da reserva do Exército Julio Miguel Molinas Dias, 78 anos. Gaúcho de São Borja, o coronel foi chefe do DOI-Codi do Rio, cerca de 10 anos depois do desaparecimento.

Em 1º de novembro deste ano, Molinas Dias foi assassinadoquando chegava de carro a sua casa, no bairro Chácara das Pedras, na capital gaúcha. Seria uma tentativa de roubar o arsenal que o coronel colecionava (cerca de 20 armas) ou um assassinato por razões ainda desconhecidas — a polícia investiga o caso.

Com a assinatura do ex-deputado
Em meio a um conjunto de papéis com o timbre do Ministério do Exército, parte deles com o carimbo "Reservado ou Confidencial" , o documento referente à entrada de Rubens Paiva no DOI-Codi foi arrecadado pelo delegado da Polícia Civil Luís Fernando Martins de Oliveira, responsável pela investigação da morte do militar.

Zero Hora acompanhou a coleta e folheou parte dos papéis. O delegado evitou divulgar o conteúdo, mas afirmou que a documentação em nada compromete a trajetória profissional de Molinas Dias.

— Pelo que consta ali, já descartamos a hipótese de o coronel ter sido morto por vingança em razão da atividade no Exército — garantiu o delegado.

Sob o título "Turma de Recebimento", o ofício contém o nome completo do político (Rubens Beyrodt Paiva), de onde ele foi trazido (o QG-3), a equipe que o trouxe (o CISAer, Centro de Inteligência da Aeronáutica), a data (20 de janeiro de 1971), seguido de uma relação de documentos, pertences pessoais e valores do ex-deputado. Na margem esquerda do documento, à caneta, consta uma assinatura, possivelmente de Paiva.

Promotor deve pedir documento

O termo de recebimento dos objetos é chancelado em 21 de janeiro de 1971 pelo então oficial de administração do DOI-Codi, cujo nome é ilegível no documento. É possível que seja o mesmo capitão que, em um pedaço de folha de caderno (também guardado por Molinas Dias), escreveu de próprio punho, em 4 de fevereiro de 1971, que foram retirados pela Seção de Recebimento "todos os documentos pertencentes ao carro" de Paiva que tinha sido levado para o DOI-Codi.

Em visita à 14ª Delegacia da Polícia Civil de Porto Alegre, na semana passada, integrantes da Comissão Nacional da Verdade — criada pelo governo federal para investigar crimes na ditadura — solicitaram uma cópia dos documentos, que deverá ser remetida a Brasília nos próximos dias.

O documento também interessa, e muito, ao promotor Otávio Bravo, que atua junto à Justiça Militar no Rio. No ano passado, ele reabriu a investigação do caso Rubens Paiva, após o Brasil ratificar em convenção internacional, o compromisso de apurar casos de desaparecimento forçado, como ocorreu com Paiva.

— Vou requisitar o documento. Não tenho conhecimento dele. Pode ser mais um indício para apurar a verdade e de que ele (Paiva) morreu no DOI-Codi — afirmou.

Segundo Bravo, até então, a informação mais contundente sobre a passagem de Paiva pelo DOI-Codi carioca se limita a relatos verbais, entre eles o de Maria Eliane Paiva, uma das filhas do ex-deputado.

Aos 15 anos, ela foi levada ao DOI-Codi para ser interrogada no dia seguinte à prisão do pai. Passadas quatro décadas, ao depor pela primeira vez sobre o caso perante o promotor, Eliane disse que ouviu de um soldado que Paiva foi morto após ser espancado no DOI-Codi.

— É a única prova que tenho de que ele foi para lá. O documento pode dar credibilidade aos depoimentos — diz Bravo.

Leia as informações presentes no ofício que confirma a prisão de Rubens Paiva no DOI-Codi no Rio:

MINISTÉRIO DO EXÉRCITO
PRIMEIRO EXÉRCITO
DOI
TURMA DE RECEBIMENTO

Nome: Rubens Beyrodt Paiva
Local: Encaminhado pelo QG-3
Data: 20.01.71
Equipe: CISAer


I - DOCUMENTOS PESSOAIS

Um cartão de identificação do contribuinte

Dois cartões de piloto privado
Um cartão do DINERS CLUB
Uma carteira nacional de habilitação
Uma carteira profissional do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura

II - PERTENCES PESSOAIS

Um porta notas de couro preto

Quatro cadernos de anotações
Um chaveiro com cinco chaves
Uma fita de gravador
Um lenço branco
Uma gravata
Um cinto de couro preto
Um paletó
14 livros de diversos autores

uma observação manuscrita: dois cadernos de anotações encontram-se com o major Belham (devolvidos os cadernos)

III - MATERIAIS DIVERSOS

Não há

IV - Publicações

Não há

V -ARMAMENTO E MUNIÇÃO

Não há

VI - VALORES

Uma caneta esferográfica de metal branco
Uma caneta esferográfica branca e cinza
Um relógio de metal branco marca Movado
Uma peça de metal amarelo

VII - DINHEIRO

CR$ 260,00 (duzentos e sessenta cruzeiros)

Na margem esquerda, à caneta, consta uma assinatura, possivelmente de Rubens Rubens Beyrodt Paiva

Rio de Janeiro, 21 de janeiro de 1971

Oficial de Administração do DOI



"É como se o meu pai se materializasse", diz filha de Rubens Paiva sobre os papéis que comprovam a prisão do político
Carlos Etchichury
carlos.etchichury@zerohora.com.br

Professora da Faculdade de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP), Vera Paiva, 58 anos, saía de uma sala de aula quando conversou com Zero Hora, no início da noite desta quarta-feira, sobredocumentos reveladores acerca do desaparecimento de seu pai, ex-deputado Rubens Paiva (PTB), 41 anos atrás.

— Fiquei completamente arrepiada com os materiais apreendidos. É como se o meu pai se materializasse na minha frente, de paletó e gravata, saindo de casa — disse Vera, ao tomar conhecimento do documento que, pela primeira vez, oficializa a passagem de Paiva pelo DOI-Codi, no Rio de Janeiro.

Vera era adolescente quando Rubens Paiva foi visto pela última vez, no Rio. Conduzido por militares em 20 de janeiro de 1971, o ex-parlamentar do PTB teria sido levado para a sede do DOI-Codi, no dia seguinte.

— Espero que essa revelação puxe outros fios e que as pessoas se comovam para resolver o problema da tortura no Brasil — complementa Vera.

Irmão de Vera, o escritor e dramaturgo Marcelo Rubens Paiva definiu como "chocante" o teor do documento lido para ele pela reportagem de ZH:

— Eu tô vendo o meu pai... Eu já vi essa cena na minha cabeça umas 7 mil vezes: meu pai chegando ao DOI-Codi.

"Sempre é a imprensa que conta a história", diz o filho Marcelo

Para Marcelo, é revelador do estágio da democracia no país e do papel relevante da imprensa.

— É a prova cabal de que a Comissão da Verdade é mais do que útil e precisa trabalhar. Não podemos deixar o acaso contar a história. A história precisa ser contada através de investigação, de apuração. Nunca é o Estado que está revelando. Foi através de jornalistas que nós soubemos do desaparecimento do meu pai. Sempre é a imprensa que conta a história — observou Marcelo.

Na opinião do escritor, trata-se de uma prova "contundente" de que o ex-deputado Rubens Paiva esteve preso no DOI-Codi.

— E aí? Cadê? O que aconteceu com ele? — complementa.

As revelações do acervo do coronel Julio Miguel Molinas Dias, 78 anos, também repercutiram junto à Comissão da Verdade Rubens Paiva, em São Paulo, que se dedica a apurar casos de desaparecimentos durante a Ditadura Militar.

Coordenador da comissão, o jornalista Ivan Seixas ressalta o aparecimento de uma prova irrefutável de que Paiva esteve num aparelho do Estado no dia 21 de janeiro de 1971 — um dia depois de ser visto pela última vez, deixando sua casa no Rio.

— É a primeira vez que se tem nas mãos um registro documental de que ele esteve no DOI-Codi — complementa Seixas, que pretende ter acesso ao material em poder da polícia gaúcha.


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21 novembro, 2012

Vislumbre do pós-lulismo (por Zé Eli da Veiga)


por José Eli da Veiga
do IHU

Cenários sobre o futuro do Brasil precisam se apoiar em boa interpretação dos "sentidos do lulismo," conforme a modesta expressão adotada por André Singer, professor de ciência política da USP, para título do excelente livro que coroou mais de 20 anos de pesquisas empíricas e teóricas sobre o tema.

O lulismo foi um "pulo do gato" consolidado por "ousadia". O pulo veio da opção preferencial por manter a ordem e driblar qualquer tipo de confronto com artilharias de capitalistas, com o objetivo de melhorar as condições de vida das camadas mais miseráveis da população, fortemente concentradas no Nordeste. A ousadia foi turbinar essa orientação sob o choque global de setembro de 2008, ao conclamar a população a "manter a confiança e comprar, arriscando-se a quebrar junto com os endividados".

Os dois movimentos foram confirmados nas eleições de 2006 e 2010. Primeiro os miseráveis substituíram as camadas médias que haviam prevalecido no "lulalá" de 2002, depois essa inversão foi até aprofundada com a votação de Dilma no Nordeste.

Esse ordeiro combate à miséria - essência da agenda lulista - já despontara de forma muito insipiente no segundo mandato de FHC. E só foi mesmo relançado a partir de setembro de 2003, com o descarte dos quase 2.400 "comitês gestores" do programa Fome Zero.

Daí ser das mais cativantes a descrição analítica proposta por André Singer do processo de adaptação do PT ao seu "condottiero". Um ótimo exemplo - mesmo que tardio, além de tropical - de como organizações políticas de anticapitalismo congênito evoluem com desconcertante rapidez ao reformismo gradualista por evitarem confrontos para conseguir governar. Reformismo que só pode ser tachado de "conservador," como faz o subtítulo do livro, na acepção mais tosca desse termo, a de não revolucionário.

Claro, debates infindáveis decorreriam de frágeis analogias históricas, de canhestras avaliações da era FHC, e até de alguns recursos a uma retórica só descodificável por leitores com séria formação marxista. Nada disso diminui, contudo, a extrema utilidade desse livro para exercícios especulativos sobre os desdobramentos do processo civilizador nestas paragens.

Tudo indica que a agenda lulista permanecerá imprescindível para muitos dos próximos governos, sejam quais forem as oscilações eleitorais. Pois, mesmo que melhore muito a qualidade do crescimento econômico, a efetiva miséria só se tornará comparável à de país desenvolvido lá por 2030, na melhor das hipóteses. Podendo se prolongar ao menos até 2060, caso sejam abalados os fundamentos materiais do lulismo, com destaque para o predatório desempenho do bloco agromineral exportador no aproveitamento das vantagens comparativas oferecidas pela abundância de recursos naturais.

O mais provável, portanto, é que o pós-lulismo - seja lá o que vier a ser - dificilmente surja antes de meados do século, a menos que seja antecipado por circunstâncias excepcionais.

Tais estimativas são necessárias para enfatizar que o ordeiro combate à miséria deverá se manter como importante componente programático de uns dez futuros governos. Isto é, que o sentido fundamental das políticas públicas revigoradas a partir de setembro de 2003 continuará a ser, em caso de alternâncias, dimensão programática básica de quaisquer outras coalizões governamentais.

A grande incógnita se refere ao eixo de uma agenda pós-miséria, a ser adotada quando começarem a surgir os sinais de seu arrefecimento. Talvez um foco explícito no combate às desigualdades, bem mais difícil de ser executado com dribles em setores economicamente dominantes, a começar pelos que estão fazendo a América nos mercados imobiliários (talvez até mais nos rurais que nos urbanos). Poderosos interesses patrimoniais serão ferozes obstáculos para que continuem a ser significativamente reduzidas desigualdades de renda, de acesso, e de oportunidades. Isto é, para que em algumas décadas os níveis de desigualdade do Brasil se aproximem dos de países como o Canadá, por exemplo.

O pior é que, além dessas resistências do patrimonialismo tupiniquim, tudo dependerá demais de fatores que nem podem ser domesticamente controlados. Mesmo na hipótese de que uma guerra nuclear continue a ser evitada, serão inviabilizados até os melhores projetos anti-miséria, quanto mais planos para a redução das desigualdades, caso não venha a ser organizada ainda nesta década uma efetiva governança multilateral do desenvolvimento sustentável.

É isso que escancara a crucial importância da política externa para a viabilização dos interesses nacionais. Se o Brasil persistir em alianças com potências das mais reticentes ao engajamento em favor da sustentabilidade (isto é: descarbonização, conservação da biodiversidade e recuperação do ciclo do nitrogênio), com certeza estará contribuindo para cavar sua própria cova, pois nada será mais sério contra uma plena realização do lulismo, do que a desordem global decorrente de um predomínio do negacionismo ecológico.

20 novembro, 2012

Judeus contra o estado sionista de Israel

Dica @Turquim5

No vídeo, durante uma manifestação, o Rabino Dovid Weiss fala como o movimento sionista, criado há 100 anos, distorce os princípios do judaísmo para criar um estado que não poupa nem mesmo os judeus que diz proteger. Vale a pena assistir.



17 novembro, 2012

O novo papel dos subprefeitos em São Paulo



por José Carlos Vaz


O prefeito Fernando Haddad terá a responsabilidade de lideraŕ o processo de reconstrução das subprefeituras em São Paulo. Nos últimos oito anos, o governo municipal andou para trás, destruindo o esforço inicial de implantação de subprefeituras operado na gestão de Marta Suplicy. A divisão do município em unidades de governo local com capacidade de atuar sobre o desenvolvimento de seus territórios é um imperativo do porte e da complexidade de São Paulo. Nesse sentido, as gestões de Serra e Kassab realizaram um erro político e administrativo de dimensões históricas, um retrocesso de efeitos dolorosos para a cidade.

Para reverter o quadro, o novo governo municipal deverá criar um novo modelo de subprefeituras, no qual o papel dos subprefeitos precisará não somente ser ampliado, mas repensado, em direção à construção de governos locais fortalecidos.

Há três grandes papéis colocados para os subprefeitos: (a) atuar como líderes dos processos de desenvolvimento local; (b) contribuir para o alargamento da democracia em São Paulo e; (c) disputar a hegemonia no pensamento político da população da cidade.

a) O subprefeito como líder dos processos de desenvolvimento local

A ideia do subprefeito como “zelador” está, definitivamente, fora de cogitação. O desafio é fazer com que o subprefeito assuma um papel de liderança junto ao governo e à sociedade, mobilizando forças políticas e atores sociais em torno de um projeto de desenvolvimento local que seja construído com a participação popular.

Ao fazer isso, os subprefeitos deverão ser capazes de captar a agenda local de cada subprefeitura e articulá-la a ideias inovadoras. Somente apontando para novos paradigmas de cidade será possível interroper o ciclo de degradação da cidade. São Paulo hoje é uma cidade esgotada. Vive uma profunda crise de qualidade de vida, da qual o colapso da mobilidade e da segurança pública são as faces mais evidentes. O modelo de cidade refém do capital imobiliário e do automóvel só trouxe degradação e sofrimento. Se, nos governos locais, imperar a mentalidade tacanha focada no curto prazo e nas soluçòes óbvias, apenas se fará mais do mesmo. Talvez um pouco melhor, mas mais do mesmo.

As desigualdades entre as subprefeituras fazem com que as agendas locais sejam bastante diferentes entre si. Um desafio central e comum da atuação dos subprefeitos deverá ser a transformação dos espaços públicos. Boa parte da crise paulistana origina-se na subordinação dos espaços públicos ao automóvel, à cultura do medo e às práticas de repressão aos pobres. Repensar os espaços públicos significa resgatar para o povo nossas praças, calçadas e parques públicos, tanto em seu desenho e manutenção, como no seu uso efetivo pelos cidadãos. Significa favorecer a expressão cultural e oferecer mais espaço de convívio. Também pode ser uma forma de envolver mais os cidadãos com o governo, através de práticas de gestão compartilhada de espaços e iniciativas.

Como líder, promotor e guardião da estratégia de desenvolvimento local, o subprefeito deverá assumir a tarefa de participar ativamente da formulação e implantação das ações no território da subprefeitura. Para isso, precisará ter pleno conhecimento das demandas, ligando-as à estratégia de desenvolvimento local. Com isso, o governo poderá realizar ações mais aderentes às reais necessidades locais. Isto vale tanto para as políticas sociais, como para os serviços públicos e os investimentos de infra-estrutura.

Outro ponto que será vital para seu desempenho é a contribuição para a busca de soluções de problemas estruturais críticos da cidade, como o colapso da mobilidade urbana e a crise da segurança pública. Ainda que a solução desses problemas fuja de sua alçada, os subprefeitos podem fazer ações complementares e, mais ainda, liderar a sociedade local na proposição e negociação de soluções.

b) A contribuição do subprefeito para o alargamento da democracia em Sào Paulo

A atuação do subprefeito não pode deixar de contribuir para alargar a democracia na cidade. Isto significa abandonar as tentações do modelo de “entrega” de subprefeituras a vereadores, que nomeiam seus representantes para administrar seu “feudo” através de seus capatazes. Sem descartar a importância dos parlamentares e lideranças políticas locais, não se pode reduzir as subprefeituras a uma extensão das máquinas políticas dos mandatos. Essa prática acaba por minar a capacidade de atuação da subprefeitura como efetivo governo democrático local, e traz enormes riscos para a gestão municipal, tornando-a indissociada dos governos conservadores.

Outorgar aos subprefeitos a responsabilidade de liderar processos democráticos de desenvolvimento local pode evitar que as subprefeituras funcionem como agências de atendimento a demandas isoladas, facilmente capturadas pelo clientelismo de esquerda ou de direita.

É preciso criar mecanismos participativos e transparentes de planejamento estratégico do desenvolvimento local que estruturem toda a ação da subprefeitura e do governo municipal em cada território. O Orçamento Participativo será decisivo, neste ponto, e deve ser prioridade dos subprefeitos.

Da mesma maneira, é preciso que as demandas sejam tratadas de forma transparente, para que a população possa confiar no governo local como capaz de priorizar as suas ações por critérios republicanos.

Alargar a democracia significa também submeter-se ao controle social. Aqui, é fundamental a implantação dos conselhos de representantes nas subprefeituras. Também é importante que as subprefeituras abram-se para a sociedade, através de práticas de transparência, por exemplo, através da publicação da origem e ordem de atendimento de serviços.

A criação de ouvidorias nas subprefeituras também contribuirá para a ampliação do controle social. Ouvidores indicados após ser consultada a sociedade podem auxiliar o subprefeito na identificação de problemas e nos entraves da máquina pública para solucioná-los.

A relação com os servidores municipais é outro elemento importante da contribuição do subprefeito ao alargamento da democracia. O respeito às organizações dos trabalhadores e a promoção de condições adequadas de trabalho certamente auxiliarão o governo municipal a atingir suas metas, mas também contribuirão para a profissionalização da força de trabalho da prefeitura.

O fortalecimento das práticas democráticas nas subprefeituras terá efeitos não somente na melhoria do governo e de sua relação com a sociedade. Também contribui para o fortalecimento dos movimentos sociais e da sociedade civil, abrindo novos espaços para sua atuação e forçando-lhe a se articularem para intervir nos novos espaços democráticos de participação e controle social das subprefeituras.

c) A subprefeitura e a disputa da hegemonia na política da cidade

Tudo o que foi apresentado até aqui também precisa ser compreendido do ponto de vista da disputa pela hegemonia política em São Paulo. O PT e a esquerda enfrentam uma encarniçada batalha no bastião das forças conservadoras e reacionárias do Brasil. A atuação do subprefeito precisa levar essa variável em conta, reforçando seu papel de face do governo mais visível e mais próxima do cidadão.

A capacidade de estabelecer práticas realmente democráticas na subprefeitura cumprirá o papel de aproximar ou reaproximar o PT e as forças de esquerda de vários segmentos da população, especialmente porque permitirão a politização da gestão pública, evidenciando as diferenças de projetos e de capacidade em relação aos governos conservadores. Estes procuram sempre, por meio de seu discurso e da imprensa, despolitizar a gestão pública pelo recurso à figura do “gestorzão competente, técnico e racional”. A esta figura ideologizada e enganadora, devemos contrapor a figura do subprefeito como líder de uma equipe de governo local capaz de dar visibilidade às disputas e encaminhar sua solução democraticamente em benefício da maioria da população, sem deixar de lado a eficiência na gestão e o domínio técnico-político das principais questões da subprefeitura.

O subprefeito, na disputa pela hegemonia a ser travada, deverá, de acordo com as características de cada localidade, atuar para reduzir e, onde possível, reverter resistências ao PT e à esquerda. Assim, o subprefeito precisará criar canais de interlocução junto a setores médios, além de ofertar soluções inovadoras a temas críticos para esses setores (por exemplo, mobilidade, atenção a idosos, revitalização de espaços públicos).

Sua atuação também deve atrair para o projeto do governo, do PT e da esquerda novos setores sociais. Nesse tópico, a juventude merece especial destaque, além dos grupos beneficiados pelas políticas públicas municipais e federal.

A disputa pela hegemonia exigirá, também, a recuperação da credibilidade do PT e da esquerda junto àqueles que se afastaram do partido e, mesmo mantendo ideias progressistas, caíram na armadilha do descrédito na política produzida pelos conservadores. Aqui, a firmeza ética, o zelo pelos recursos públicos, a transparência e a postura democrática serão ingredientes decisivos.

A disputa pela hegemonia passa também por uma postura ativa no campo da cultura. Não se trata, aqui, de dirigismo ou de cooptação dos artistas e produtores culturais. O que é importante é que os subprefeitos sejam capazes de abrir espaço para o acesso de todos à cultura, fortalecendo os artistas e produtores, profissionais ou amadores, estimulando a circulação de ideias e o pensamento crítico. Ao dar voz à periferia, à juventude e aos marginalizados, mais espaço se abre na luta contra a direita.

Não basta um governo melhor; é preciso ser um governo diferente

Exercendo esses papéis, os subprefeitos contribuirão para que o governo de Fernando Haddad fique marcado positivamente na história da cidade como um governo que avançou na área social, no desenvolvimento e modernização da gestão pública.

Mas isso não é tudo. Um governo de esquerda não pode apenas fazer melhor o que a direita já faz. Precisa avançar na ampliação dos direitos e na radicaĺização da democracia, sob a pena de confundir-se com os governos do centro e da direita.

Portanto, a condução do processo de reconstrução das subprefeituras não pode esgotar-se nestes pontos. É preciso que, ao longo dos próximos quatro anos, se construa um modelo que consolide esse novo papel mas também radicalize a democracia, com a criação dos conselhos de representantes nas subprefeituras e com a criação de novas formas de escolha dos subprefeitos. Esta decisão deve passar a combinar competências políticas e gerenciais, afinidade com o projeto do governo municipal e participação da sociedade em sua escolha.

14 novembro, 2012

Filhos de chocadeiras


Imagem do Midiailluminatti


O que esperar dessa garotada que resolve agremiar-se partidariamente sob uma sigla chamada ARENA, cujo objetivo maior, em 2012, é combater o comunismo? De onde saem essas crianças?

Serão os filhos daqueles pais que se endividam para pagar o condomínio gradeado e a “melhor” escola onde vão transportados por carros mais caros que um apartamento e com vidros com a película mais escura que há no mercado? Serão filhos que moram naquelas casas onde as televisões de todos os cômodos estão sempre ligadas para entreter as crianças pois a empregada – que mora lá nos cafundós onde as empregadas moram - trabalha de domingo a domingo e se desdobra entre compras no mercadinho, serviço de babá, faxineira, cozinheira e passadeira porque os pais, ocupadíssimos, tem que trabalhar muito para pagar as contas e não podem faltar às reuniões sociais, com desfile de pratos e grifes, pois as boas relações com as “melhores famílias”  são tudo o que importa para garantir o futuro.

Serão filhos de pais que dão carro zero, é claro, porque o filho passou no vestibular - para o qual teve que estudar muito porque agora "com essas cotas pra essa gente" - e nesse mesmo instante já planejam a festa de formatura e o casamento que virá logo em seguida?

Serão filhos de pais que aplaudem quando um policial é flagrado batendo ou matando um suspeito, preto? Serão filhos de pais que flagrados além do limite de velocidade a caminho da praia dão um tostãozinho ao policial pra deixar por isso mesmo e chegando à beira-mar contam, em meio a cervejas importadas e bons amigos que “saiu baratinho”? E à noite em frente ao jornal da Globo dizem que "esse país com essa corrupção não tem jeito, mesmo, ah, se fosse nos Estados Unidos"...

10 novembro, 2012

A imprensa e os mortos anônimos

por Mauro Malin 
do Observatório da Imprensa

Desde segunda-feira (5/11), os dois grandes jornais paulistas já não dão os nomes das pessoas mortas ou feridas em refregas entre policiais e criminosos, ou entre policiais criminosos e criminosos, ou entre policiais e policiais criminosos, ninguém pode ainda afirmar ao certo.

Configura-se um quadro de epidemia. Não como metáfora, mas literalmente: as primeiras poucas ocorrências são individualizadas, repórteres ouvem médicos e parentes, descrevem o contexto em que se deu o óbito. De certo ponto em diante isso se torna impossível, faltam tempo e espaço.

Enquanto foi percebido como varejo, o surto homicida atual na Grande São Paulo permitiu circunstanciar os casos, antes de tudo dando nomes aos mortos. No atacado, os indivíduos viraram números. No Rio de Janeiro, pouco menos de duas décadas atrás, a polícia regrediu do estágio da “autoria desconhecida” para o da “identidade desconhecida”. Ou seja, começaram a enterrar corpos anônimos ? e a desistir de toda e qualquer investigação.

(Não se pode ignorar, ao mesmo tempo, que mortos da periferia paulistana não pertencem ao leitorado desses jornais. Se houvesse uma chacina de moradores dos Jardins, os jornais dariam nomes, fotos, resumos biográficos, chamada na primeira página, talvez manchete. Mas, criminosos ou policiais, os mortos no surto epidêmico em curso são da periferia.)

Trem sem freio

Os jornais são poder-dependentes, como já se disse dezenas de vezes neste Observatório da Imprensa. No dia a dia, os governos fazem as pautas. Isso cria no mínimo um vezo, frequentemente um vício, o de considerar importante toda emanação oficial, mesmo quando ela é uma forma de esconder o que se sabe.

Foi o caso do anúncio da cooperação entre governo federal e SP, antecedido e sucedido por bate-bocas partidários. Os governos passam para jornalistas e pesquisadores apenas uma parte do seu conhecimento, menos vexaminosa.

O governo paulista criou uma situação que o deixou a reboque do PCC e só consegue reagir com aumento de violência (inclusive em algumas cadeias, com o RDD, Regime Disciplinar Diferenciado, que uma alma nada caridosa, Fernandinho Beira-Mar, classificou como “fábrica de loucos ou de monstros”).

Caiu numa armadilha criada por suas políticas penal e prisional. Há anos o Executivo, o Judiciário e o Ministério Público de São Paulo enchem cadeias que estão fora de controle. Ou melhor, são controladas pelo PCC, a organização criminosa que venceu todos os embates no mundo do crime e se afirmou como hegemônica. O governo fornece ao PCC, diariamente, dezenas de pés de chinelo que são transformados em profissionais.

A organização usa mais do que violência, coerção, pressão e chantagem para se impor. Teria conseguido, dentro das prisões, uma disciplina tão estrita, assumida com tal empenho por seus integrantes, que funciona nas ruas, longe dos chefões (seriam 14, atualmente). Por isso pôde passar de um formato de comando verticalizado para um horizontalizado, que se amolda à territorialização.

Tem coesão e organização superiores às das forças policiais paulistas e de outros estados, um enraizamento muito maior nos territórios que controla (capital e mais de 120 cidades do interior de São Paulo, partes de Rio de Janeiro, Bahia, Alagoas, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Paraná, Santa Catarina, Minas Gerais e Rondônia), embora não tenha, nem de longe, poder de fogo superior. Mas, agindo como guerrilha, torna-se temível.

Policiais criminosos

Por que, com um poder de fogo superior, a polícia paulista teve mais mortos em 2012 do que o PCC, ainda mais quando se incluem na categoria de bandidos “suspeitos” que são mortos por arrasto?

Uma questão central é a da criminalidade policial. Pessoas sérias familiarizadas com o tema acreditam que ela esteja na origem da atual temporada de horror: grupos de policiais se teriam tornado comercializadores de drogas ilícitas (começam a ser chamados de milícias, o que é um duplo erro: no Rio de Janeiro, o nome já não tinha cabimento quando foi inventado por jornalistas; os grupos de São Paulo teriam começado disputando diretamente território com traficantes).

Trata-se de uma velha lição: não há limites confiáveis entre os diferentes tipos de ilegalidade. Se um policial bate num preso, pode roubá-lo também. Se executa um “suspeito”, pode assaltar um caixa eletrônico (há PMs acusados de praticar essa modalidade de crime).

Uma situação dramática é vivida dentro das corporações policiais: os honestos são obrigados a conviver com os outros e fingir que não sabem de nada. A alternativa é pular fora da carreira. Existem também casos, não raros, de suicídio de policiais. É difícil enfrentar a criminalidade dentro de casa. Por definição, policiais detêm muitas informações sobre cidadãos comuns, e muitas mais ainda sobre colegas.

Polícia Civil escanteada

Outros especialistas dão mais peso, como fator de desencadeamento da crise, à própria política de (in)segurança pública praticada pelos governos paulistas desde, para não ir mais longe, Paulo Maluf (1979-1982). Agora, a maior autoridade policial paulista, oficial da reserva da PM Antonio Ferreira Pinto, integrante do Ministério Público, ex-secretário da Administração Penitenciária, decidiu em 2009, ao assumir a Secretaria de Segurança, combater núcleos de corrupção na Polícia Civil.

De fato, a repetição de episódios criminosos envolvendo policiais civis se tornara escandalosa. Vide o milhão e meio de dólares extorquido do traficante colombiano Juan Carlos Ramirez Abadia, preso em 2007 (ele cumpre condenação nos Estados Unidos), para citar um entre numerosos casos expostos na imprensa, e tanta coisa mais que não chega ao conhecimento do público.

Escandalosa e perigosa. Um dos ingredientes da ofensiva do PCC que parou São Paulo em maio de 2006 foi o sequestro, pouco mais de um ano antes, de um enteado de Marcola, Marcos Willians Herbas Camacho, considerado o ocupante do topo da hierarquia da organização. Filho de Ana Maria Olivatto, ex-mulher de Marcola assassinada por rivais dele em 2002, Rodrigo Olivatto de Morais foi liberado pelo policial civil Augusto Peña em troca de R$ 300 mil. Marcola prometeu retaliação.

Uma reportagem detalhada sobre crimes de que era acusado Peña foi publicada pela Folha de S. Paulo em maio de 2008. Seu autor foi o repórter André Caramante. Aqui, é necessário abrir um parêntese. O que aconteceu meses atrás com Caramante configura um dos mais graves atentados recentes contra a democracia. E foi inspirado por um egresso da Polícia Militar.

O hoje vereador coronel Telhada, então candidato pelo PSDB paulistano, saudou no Facebook nove homicídios ocorridos na cidade de Vargem Grande Paulista em operação da Rota, tropa da qual havia sido comandante até pouco tempo antes. Por ter noticiado a postagem de Telhada, Caramante passou a ser ameaçado e teve que se exilar fora do Brasil. Caramante é um perseguido profissional e político.

Uma Rota “investigativa”

No domingo (4/11), reportagem de Bruno Paes Manso publicada no Estado de S. Paulo (“Por que SP chegou à situação atual?”) reafirma que o secretário Ferreira Pinto, ao deslocar das investigações a Polícia Civil, deu mais poderes à Polícia Militar, chegando a incumbir a Rota, tropa de choque da PM, de fazer investigações sobre o PCC. Mas quem passou anos colhendo informações sobre o PCC, para o bem e para o mal, foi a Polícia Civil.

A Constituição brasileira reconhece, entre diferentes polícias, a polícia judiciária (encarregada de investigações, a mando da Justiça), vulgo polícia civil, e a militar, encarregada da “polícia ostensiva” e da “preservação da ordem pública”. Não se entende que amparo legal teria essa determinação de Ferreira Pinto. Entende-se, porém, que foi uma “solução” exterminadora.

Herança de um tempo (fim dos anos 1960 e décadas de 1970/80) em que esquadrões da morte e “justiceiros” eram considerados instrumentos necessários à “limpeza social”, como relata o mesmo Bruno Paes Manso em tese de doutorado defendida em agosto na USP (ver Crescimento e queda dos homicídios em SP entre 1960 e 2010 ? Uma análise dos mecanismos da escolha homicida e das carreiras no crime). As polícias seguiam a trilha dos assassinatos de oponentes do regime militar, considerados pelos órgãos de repressão “inimigos internos”.

O resultado prático da incumbência dada à Rota por Ferreira Pinto foi uma perda ainda maior de controle da situação. E pode ter sido também a formação de quadrilhas de policiais militares, hipótese mencionada acima. Essa possibilidade se tornou mais verossímil quando dois PMs à paisana foram mortos num ponto de venda da favela de Heliópolis e se ficou sabendo que ninguém os havia mandado realizar algum tipo de missão naquele local (noticiário de 1/11).

O primado das aparências

Voltemos às notícias sobre a cooperação governamental. Todos os passos das autoridades eleitas e de seus auxiliares são filtrados pelo crivo de pesquisas de opinião. Os dois “lados”, governo federal petista e governo estadual tucano, não se encontraram por estar convencidos de que a cooperação é um caminho indicado para melhorar a vida dos cidadãos, ou, pelo menos, aliviar-lhes o sofrimento. Dilma, Cardozo e Alckmin pensam “naquilo”: 2014.

E foi consenso dos dois lados que o bate-boca, dias depois do segundo turno das eleições municipais (a onda de assassinatos começara em maio), pegava mal, poderia ser explorado por uns para criticar os outros. Então, certo, vamos encenar a cooperação.

Criminalidade e política estão ligadas por diferentes canais: mercado financeiro, laços das polícias com atividades criminosas, avaliação pela opinião pública da competência das autoridades. Que ninguém se iluda. No Brasil, de modo geral, autoridades só encaram o doloroso dever de aumentar a eficácia policial quando o estado de coisas ameaça desempenhos eleitorais. E quase sempre insistem na força sem inteligência-

Armas e drogas permanecerão

Não existe a possibilidade de “acabar” com o tráfico de armas e drogas. Pode haver tentativas mais ou menos bem-sucedidas de manter controle sobre essas modalidades de delinquência. A solução menos ruim que se vislumbra no caso das drogas é a legalização, como ocorre com álcool e tabaco, entretanto de longe mais mortíferos do que as drogas ilegais (por isso há tantas dúvidas respeitáveis quanto aos resultados da legalização: ninguém pode prever com um mínimo de certeza o que adviria dela).

Em todo caso, uma coisa é morrer devido ao uso ou abuso de uma droga e outra é levar um balaço em meio a conflitos entre mocinhos e bandidos. Nos EUA, com a legalização do uso “recreativo” da maconha em alguns estados, decidida agora em plebiscito, pode estar sendo dado um passo que mereça acompanhamento.

Quanto às armas, as legislações diferem de país para país, como se sabe. Restrições poderiam resultar do controle da produção: a esmagadora maioria das armas é produzida legalmente, sob licença expressa de autoridades. Teria de haver um acordo geral para proibição de venda ao público de armas de fogo. No estágio atual de subdesenvolvimento mental da humanidade (como um todo, para efeitos práticos), isso é miragem. No Brasil, um referendo derrotou em 2005 a proposta.

Fronteira indomável

“Fechar” as fronteiras brasileiras, como sempre reivindicam governadores, secretários de (in)Segurança Pública, delegados-gerais, comandantes de Polícias Militares, não é uma proposta séria. Se os Estados Unidos, com um PIB seis vezes maior do que o brasileiro, não conseguem “fechar” sua fronteira com o México (3.141 km), por onde entram as maiores quantidades de drogas ilícitas do planeta, o que poderá fazer o Brasil, com 10 vizinhos e 16.885 km de fronteiras?

O que as polícias conseguem é dar grandes “botes” sobre quadrilhas, descobrindo, a partir de quem as recebe, onde as armas foram compradas, e assim sucessivamente, a montante. E, na eventualidade de haver êxito, é preciso garantir que as armas não sejam revendidas a bandidos por policiais canalhas, o que é corriqueiro no Brasil.

Inteligência policial?

Repetiu-se, no contexto da prometida cooperação União-estado, o discurso da inteligência policial. Mas como inteligência, se o que se vê na prática é o uso de informações pelas “bandas podres”? No Rio de Janeiro, policiais investigaram lavagem de dinheiro com métodos sofisticados e usaram o resultado das investigações para achacar parentes de chefões presos. As represálias tiveram péssimas consequências.

Inteligência policial acabou virando rótulo para um frasco com muitos componentes disparatados, que acabam se anulando. Nada é especificado, com o argumento de que se trata de operações sigilosas. No quadro atual, de falta de confiança nas polícias, quanto mais sigilo, maior a suspeita.

Infelizmente, a inteligência policial se subordina a uma cadeia de comando cujo vértice é ocupado por presidente e governadores que põem em primeiríssimo lugar, como (quase) todos os ocupantes de cargos eletivos neste país, sua própria imagem.

Mortos não são números

De volta aos mortos sem nome. A imprensa não deveria aceitar manipulações estatísticas. É cretinismo numérico argumentar que a taxa de homicídios na cidade de São Paulo “deu um salto”, tanto quanto responder que ela permanece muito abaixo da média nacional. Não é de números que se trata, é do peso simbólico das mortes.

Existem três vertentes: mortos sem rótulo, vítimas colaterais da guerra particular entre a Rota e o PCC, ou vice-versa. Em face delas, o que aflora, pela enésima vez, é a constatação de que a vida humana vale muito pouco no Brasil. A repetição desse massacre cotidiano amortece o sentimento de compaixão pelos que perdem seus entes queridos. De um ponto de vista pragmático (mas não cínico), logo, logo, quando a transição demográfica estiver mais avançada, o país lamentará amargamente ter perdido tantos braços jovens.

No segundo grupo podem ser colocados os integrantes do PCC. Essas mortes representam muito mais do que o número que as sintetiza. Elas engendram revanches (desde o início da guerra particular, chefes do PCC estipularam que cada vida dos seus custaria duas da PM). Para os moradores das áreas dominadas pela organização, é o terror.

Não existe salvo-conduto contra bala perdida. Não há como conter o medo que toma conta de PMs quando estão ou pensam estar diante de integrantes do PCC. A recíproca é verdadeira. A maior parte dos bandidos capturados manifestam pânico quando dominados por PMs: é quase uma sentença de morte. O pânico e o desespero são péssimos conselheiros. Mais uma vez, todos perdem e sobra para os moradores.

Por fim, mas não em último lugar, as mortes de policiais militares. As consequências de 90 mortes de PMs em seis meses são incalculáveis. Uma pesada derrota para a corporação, para os cidadãos e para as instituições. Nesse ritmo, que se espera não perdure, a PM de São Paulo perderia em dois anos e meio o mesmo número de homens que o Exército brasileiro deixou no cemitério militar de Pistoia, na Itália, mortos em combate contra os nazistas.

09 novembro, 2012

O Mensalão Tucano



O Conversa Afiada republica editorial de Mino Carta, extraído da CartaCapital:

A mídia nativa entende que o processo do “mensalão” petista provou finalmente que a Justiça brasileira tarda, mas não falha. Tarda, sim, e a tal ponto que conseguiu antecipar o julgamento de José Dirceu e companhia a um escândalo bem anterior e de complexidade e gravidade bastante maiores. Falemos então daquilo que poderíamos definir genericamente como “mensalão” tucano. Trata-se de um compromisso de CartaCapital insistir para que, se for verdadeira a inauguração de um tempo novo e justo, também o pássaro incapaz de voar compareça ao banco dos réus.

Réu mais esperto, matreiro, duradouro. A tigrada atuou impune por uma temporada apinhada de oportunidades excelentes. Quem quiser puxar pela memória em uma sociedade deliberadamente desmemoriada, pode desatar o entrecho a partir do propósito exposto por Serjão Motta de assegurar o poder ao tucanato por 20 anos. Pelo menos. Cabem com folga no enredo desde a compra dos votos para a reeleição de Fernando Henrique Cardoso, até a fase das grandes privatizações na segunda metade da década de 90, bem como a fraude do Banestado, desenrolada entre 1996 e 2002.

Um best seller intitulado A Privataria Tucana expõe em detalhes, e com provas irrefutáveis, o processo criminoso da desestatização da telefonia e da energia elétrica. Letra morta o livro, publicado em 2011, e sem resultado a denúncia, feita muito antes, por CartaCapital, edição de 25 de novembro de 1998. Tivemos acesso então a grampos executados no BNDES, e logo nas capas estampávamos as frases de alguns envolvidos no episódio. Um exemplo apenas. Dizia Luiz Carlos Mendonça de Barros, presidente do banco, para André Lara Rezende: “Temos de fazer os italianos na marra, que estão com o Opportunity. Fala pro Pio (Borges) que vamos fechar daquele jeito que só nós sabemos fazer”.

Afirmavam os protagonistas do episódio que, caso fosse preciso para alcançar o resultado desejado, valeria usar “a bomba atômica”, ou seja, FHC, transformado em arma letal. Veja e Época foram o antídoto à nossa capa, divulgaram uma versão, editada no Planalto e bondosamente fornecida pelo ministro José Serra e pelo secretário da Presidência Eduardo Jorge. O arco-da-velha ficou rubro de vergonha, aposentadas as demais cores das quais costuma se servir.

Ah, o Opportunity de Daniel Dantas, sempre ele, onipresente, generoso na disposição de financiar a todos, sem contar a de enganar os tais italianos. Como não observar o perene envolvimento desse monumental vilão tão premiado por inúmeros privilégios? Várias perguntas temperam o guisado. Por que nunca foi aberto pelo mesmo Supremo que agora louvamos o disco rígido do Opportunity sequestrado pela PF por ocasião da Operação Chacal? Por que adernou miseravelmente a Operação Satiagraha? E por que Romeu Tuma Jr. saiu da Secretaria do Ministério da Justiça na gestão de Tarso Genro? Tuma saberia demais? Nunca esquecerei uma frase que ouvi de Paulo Lacerda, quando diretor da PF, fim de 2005: “Se abrirem o disco rígido do Opportunity, a República acaba”. Qual República? A do Brasil, da nação brasileira? Ou de uma minoria dita impropriamente elite?

Daniel Dantas é poliédrico, polivalente, universal. E eis que está por trás de Marcos Valério, personagem central de dois “mensalões”. Nesta edição, Leandro Fortes tece a reportagem de capa em torno de Valério, figura que nem Hollywood conseguiria excogitar para um policial noir. Sua característica principal é a de se prestar a qualquer jogo desde que garanta retorno condizente. Vocação de sicário qualificado, servo de amos eventualmente díspares, Arlequim feroz pronto à pirueta mais sinistra. Não se surpreendam os leitores se a mídia nativa ainda lhe proporcionar um papel a favor da intriga falaciosa, da armação funesta, para o mal do País.

Pois é, hora do dilema. Ou há uma mudança positiva em andamento ou tudo não passa de palavras, palavras, palavras. Ao vento. É hora da Justiça? Prove-se, de direito e de fato. E me permito perguntar, in extremis: como vai acabar a CPI do Cachoeira? E qual será o destino de quem se mancomunou com o contraventor a fim de executar tarefas pretensamente jornalísticas, como a Veja e seu diretor da sucursal de Brasília, Policarpo Jr., uma revista e um profissional que desonram o jornalismo.


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Assista também o vídeo do Bob Fernandes sobre o Mensalão dos 79




08 novembro, 2012

Os mistérios do coronel assassinado em Porto Alegre

Do IHU 

Imagem: Diário Gaúcho


As pistas colhidas pela Polícia Civil, até agora, apontam para uma luta entre o coronel Júlio Miguel Molinas Dias e seus captores. Teriam ocorrido disparos de lado a lado, conforme revela o repórter José Luís Costa. Uma reação do militar a um possível assalto é vista pelos policiais como muito provável, já que ele estava armado.

A reportagem é de Humberto Trezzi e publicada por Zero Hora Digital, 02-11-2012.

Provável é, mas o caso ainda está longe de esclarecido. Por vários fatores. O primeiro é que assaltantes, via de regra, não costumam disparar mais de 10 tiros contra suas vítimas. Eles não têm questões pessoais a acertar com elas, querem apenas roubá-las. Por que teriam desfigurado o coronel Dias a tiros? Difícil acreditar em ladrões tão vingativos.

A segunda questão é a própria trajetória do coronel. Ele foi integrante do DOI (Destacamento de Operações de Informações do Exército) durante a ditadura militar. No livro Aventura, Corrupção, Terrorismo - A Sombra da Impunidade, o coronel Dickson Grael (também do Exército) fala que os autores do atentado no Riocentro, em maio de 1981, trabalhavam com Dias no DOI do Rio de Janeiro. Dias, na época, era tenente-coronel e chefiava a repartição encarregada de vigiar a oposição ao regime militar no Brasil. O livro não chega a implicar pessoalmente Dias no atentado a bomba, mas menciona que a tentativa de explodir o centro de eventos envolvia diversos grupos de militares ligados à repressão política, como era o caso dele.

Ou seja, adversários ideológicos não faltavam para Dias.

O envolvimento do DOI no atentado do Riocentro também é mencionado num livro bem mais recente, "Tempos de Guerra", do ex-delegado capixaba Cláudio Guerra. Guerra atuava no temido Departamento de Ordem Política e Social (Dops) e relaciona mais de uma centena de nomes de envolvidos na repressão política. Guerra será chamado pelaComissão da Verdade, em Brasília, a depor.

A doutrina da comunidade de informações diz que os agentes aposentados — que se envolveram em episódios pesados — devem se acompanhados por algum tempo. O acompanhamento é feito por pessoas bem próximas, sem levantar suspeitas. Depois de uma certa idade, este tipo de aposentado entra para a comunidade dos "esquecidos": aqueles que têm uma idade avançada e vão levar as informações confidenciais para o túmulo.

Algumas perguntas precisam ser feitas, antes de tudo, a respeito do assassinato do coronel Dias:

— Ex-colegas do tempo da repressão teriam motivos para temê-lo?

— Ex-adversários da ditadura política teriam tentado persegui-lo? — Dias conhecia seus captores?

— Dias foi sondado ou convocado para falar na Comissão da Verdade, que visa esclarecer assassinatos durante a ditadura militar?

— O que fez Dias nos quase 30 anos posteriores ao fim da ditadura militar?

— Dias colheu inimigos em alguma de suas atividades, depois de se aposentar?

Antes de respondidas estas questões, difícil considerar o caso fechado.

07 novembro, 2012

Só o PCC ameaça São Paulo?



Por Antonio Martins
Do Outras Palavras

I.

Ao descrever, num ensaio recente (breve em português, em Outras Palavras), a situação tormentosa vivida pela Grécia, o jornalista Paul Mason, da BBC, recorre à história da Alemanha, às portas do nazismo. Só uma sucessão de erros crassos, mostra ele, pôde permitir que Hitler chegasse ao poder. Mas havia algo sórdido por trás destes enganos. Embora não fosse conscientemente partidária do terror, a maior parte das elites alemãs desejava o autoritarismo, pois já não conseguia tolerar o ambiente democrático da república de Weimar.

As circunstâncias são distintas: não há risco de fascismo no cenário brasileiro atual. Mas é inevitável lembrar de Mason, e de sua observação sobre a aristocracia alemã, quando se analisa a espiral de violência que atormenta São Paulo há cinco meses. Em guerra com a facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), parte da Polícia Militar está envolvida numa onda de assassinatos que já fez dezenas de vítimas, elevou em quase 100% o índice de homicídios no Estado e aterroriza as periferias.

Pior: a escalada foi iniciada (e é mantida e aprofundada) por integrantes da própria PM, a força que deveria garantir a segurança e o cumprimento da lei no Estado. Mas apesar de inúmeras evidências, o governo do Estado não age para refrear tal atitude. E a mídia omite, ao tratar da onda de mortes, a participação e responsabilidade evidentes da polícia. É como se tivessem interesse em manter, em São Paulo, um corpo armado, imune à lei e ao olhar da opinião pública, capaz de se impor à sociedade e diretamente subordinado a um governador cujos laços com a direita conservadora são nítidos.

Para ocultar o papel de parte da PM na avalanche de brutalidade, a mídia criou um padrão de cobertura. As mortes de autoria do PCC são noticiadas, corretamente, como assassinatos de PMs. Informa-se que o número de crimes deste tipo cresce de modo acelerado — já são 90 vítimas, este ano. Mas se associa a insegurança que passou a dominar o Estado apenas a estes atos. Também informa-se sobre parte das mortes praticadas pela PM — seria impossível escondê-las por completo. No entanto, aceita-se, sempre sem investigação jornalística alguma, a versão da polícia: morreram “em confronto”, depois de terem reagido.

Este estratagema permite silenciar sobre três fatos essenciais e gravíssimos: a) parte da PM abandonou seu compromisso com a lei e a ordem pública e passou a agir à moda de um grupo criminoso, colocando em risco a população e a grande maioria dos próprios policiais, honestos e interessados em cumprir seu papel; b) diante desta subversão do papel da PM, o comando da corporação e o governo do Estado estão, ao menos, omissos; c) procura-se preservar este estado, evitando, recorrentemente, caracterizar a atitude do setor criminoso da polícia e, muito menos, puni-lo.

II.

Algumas iniciativas permitiram, nos últimos dias, começar a quebrar a cortina de silêncios e omissões. O jornalista Bob Fernandes, editor-chefe do Terra Magazine, sustentou, num comentário corajoso, em noticiário da TV Gazeta, que havia algo além do crime organizado, por trás da onda de assassinatos. “Rompeu-se um pacto entre polícia militar e PCC”, frisou Fernandes — e atribuiu a esta ruptura tanto a “guerra” entre os dois grupos como a espiral de morte que se seguiu. “Criminosos matam de um lado? Vem a resposta: alguns, quase sempre em motos, com munição de uso exclusivo de forças policiais, dão o troco e também matam.”

A fala do editor do Terra Magazine teve o mérito de romper o consenso que a mídia fabricava, até então, em torno de uma explicação inconsistente. Mas a que se referiria ele, ao mencionar, em linguagem quase enigmática, a ruptura de um pacto?

Uma das pistas, para encontrar a resposta, é seguir o fio da meada da onda criminosa. Quando ela teria começado? Por quais motivos? Entre o final de maio e o presente, os jornais estão fartos de notícias sobre os assassinatos, sempre no padrão descrito acima. Mas não é difícil encontrar um ponto de inflexão, o momento a partir do qual o cenário se transforma.

Ele situa-se precisamente em 29 de maio. Nesta data, quando ainda não adotava a confirmação sem checagem das versões da Polícia Militar, O Estado de S. Paulo registra um massacre. Seis pessoas foram mortas pela ROTA, uma unidade da PM conhecida pela truculência. Estavam num estacionamento, próximo à favela da Taquatira, Zona Leste da capital. Foram vítimas de um comando constituído por 26 policiais. A própria PM afirmou, na ocasião, que eram integrantes do PCC. Alegou-se que estariam reunidas (num estacionamento?) para “traçar um plano de resgate de um preso”. Segundo as primeiras versões, teriam “atirado contra os policiais”. Apesar de numerosas (segundo a PM, 14 pessoas, das quais três foram capturadas e cinco fugiram), e “fortemente armadas”, nenhum soldado sequer se feriu.

Esta versão fantasiosa foi desmentida logo em seguida. Pouco depois da ação policial, um dos mortos “em confronto” seria executado a sangue frio, por parte dos PMs que haviam participado da operação. Os assassinos agiram em pleno acostamento da rodovia Ayrton Senna, e em área habitada. Uma testemunha presenciou o crime e o denunciou, enquanto acontecia, pelo telefone 190. A sensação de impunidade dos assassinos levou-os a ser fotografados pela próprias câmeras de vigilância da estrada. Nove dos 26 policiais foram presos, horas depois. Destes, seis foram soltos em dois dias. Três — apenas os que teriam praticado diretamente a execução — permaneceram detidos. Não é possível encontrar, nos jornais, informações sobre sua situação atual.

Atingido, o PCC reagiu recorrendo, embora em escala limitada, ao método que marcou sua atuação em 2006. Na região de Cidade Tiradentes, uma das mais pobres da cidade e local de moradia de um dos mortos, o grupo obrigou a população a um toque de recolher no dia do enterro do comparsa, 31 de maio. Tiveram de fechar as portas, entre outras, as escolas municipais Adoniran Barbosa e Wladimir Herzog… Mas, também repetindo o que fizera em 2006, a facção não se limitou a isso. Começaria, logo em seguida, a longa série de assassinatos de policiais militares.

No ano passado, 47 PMs paulistas foram mortos, em serviço ou suas folgas. Não é um número excepcional, para uma corporação que reúne quase 100 mil soldados, exerce atividade de risco e vive sob tensão permanente (o índice anual de suicídios é muito próximo ao das vítimas de homicídio). Em 2012, tudo mudou. Até o incidente fatídico de 29/5, haviam sido contabilizadas 29 mortes de PMs — pouco acima da média registrada no ano anterior. Entre 29/5 e 4/11, os ataques disparam. São 61 novos assassinatos, em apenas cinco meses. Há casos dramáticos: uma policial morta diante de sua filha; um garoto assassinado apenas por ser filho de policial, ocasiões em que as próprias bases da PM são atacadas. Inúmeros relatos narram a situação de pânico vivida por milhares de soldados honestos, cuja vida foi subitamente colocada em risco numa “guerra” provocada por uma minoria.

Mas aos poucos — e aqui começa um dos pontos mais obscuros de todo o episódio –, a PM parece inclinar-se em favor de sua banda violenta. Além de ter provocado o PCC à luta no final de maio, num ataque cujo caráter criminoso está demonstrado, a polícia paulista empenhou-se, nos meses seguintes, em tornar a disputa cada vez mais sangrenta e mais letal para a população civil.

Alguns episódios são emblemáticos desta tendência e da barbárie produzida por ela. Em 10 de outubro, por exemplo, um soldado de 36 anos foi executado em Taboão da Serra, oeste da Grande São Paulo. Dois homens dispararam seis tiros em seu corpo. Nas horas seguintes, no mesmo município, nove pessoas foram assassinadas. Duas delas foram vítimas da ROTA — execuções, segundo testemunhas. As sete outras, em circunstâncias nunca esclarecidas, mas muito assemelhadas às descritas por Bob Fernandes, em seu comentário recente. Poucos dias antes, na Baixada Santista, um outro episódio, em condições muito semelhantes, deixou, em cinco dias, um rastro de quinze mortos. Em nenhum destes casos houve investigações sobre o comportamento dos policiais — nem por parte de seus pares, nem da mídia…

A esta altura é perturbador, porém inevitável, traçar um paralelo. Radicalizar ao máximo a guerra contra o PCC; afogar o “inimigo” em sangue, sem se importar com o risco de atingir a população como um todo, foi a estratégia que prevaleceu na PM em 2006, quando a força enfrentou pela primeira vez o grupo criminoso. Entre 12 e 20 de maio daquele ano, mais de 500 pessoas foram assassinadas em chacinas e execuções na capital, região metropolitana, interior e litoral de São Paulo. A grande maioria não tinha relação alguma com o PCC, como denunciam, desde então, as Mães de Maio. Adotou-se aparentemente a ideia de que deflagrar terror indiscriminado contra a população forçaria o grupo criminoso a recuar, temeroso de perder apoio de suas bases sociais.

III.

Um personagem destacado é comum aos episódios de 2006 e aos de hoje: o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin. Não estava diretamente à frente do Palácio dos Bandeirantes, durante a primeira rebelião do PCC (deixara o posto um mês antes, para concorrer à presidência da República). Mas havia governado o Estado nos seis anos anteriores e executara uma política de segurança considerada ao mesmo tempo brutal e ineficiente. Sua ligação com os acontecimentos ficou patente ao abandonar, de modo abrupto, uma entrevista em que jornalistas britânicos (ao contrário da grande mídia brasileira) questionaram-no sobre o ocorrido.



Apontado como membro da organização ultra-direitista Opus Dei, até mesmo por integrantes de seu partido (o PSDB), Alckmin é visto, por parte da elite brasileira, como uma liderança importante a preservar. As declarações que tem dado, desde maio, em favor das posições mais belicosas e agressivas, no interior da PM, são eloquentes.

Falta muito a apurar, na trilha tenebrosa e caótica para a qual descambou a segurança (?) pública em São Paulo, desde maio. Por que, após uma tentativa fugaz de investigar ações ilegais e criminosas de parte de seus integrantes, a PM desistiu do esforço? Que levou a imprensa — que também denunciou a truculência, num primeiro momento — a silenciar e a repetir, desde junho, uma versão insustentável? Um setor de policiais especialmente violento terá conseguido impor sua postura? De que forma estarão envolvidos o governador e a imprensa?

O certo é que, para interromper a escalada sangrenta, a sociedade precisa agir — o quanto antes.

06 novembro, 2012

BH, a capital do ‘caixa 2′

por Maurício Dias 
da Carta Capital
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Destaques a partir da imagem da publicada na Carta Capital   

Em breve, como se espera, o Supremo Tribunal Federal, após o julgamento do chamado “mensalão petista”, se encarregará do Inquérito 3.530, conhecido, mas ainda não popularizado, como mensalão tucano, igualmente originado em Minas Gerais e até agora ainda sob a relatoria do ministro Joaquim Barbosa, que assumirá a presidência do STF em novembro, pelo princípio do rodízio. Não se sabe se abrirá mão da tarefa. Provavelmente, sim.

O mensalão tucano, e não mineiro, como às vezes se diz e se escreve, ora por descuido e, principalmente, por má-fé, montado a partir de Belo Horizonte, em 1998, para a reeleição do então governador mineiro Eduardo Azeredo, está intimamente ligado ao processo eleitoral nacional e, por consequência, à reeleição de Fernando Henrique Cardoso.

Marcos Valério, o publicitário, ou operador financeiro, como é caracterizado, passou a ser o fio condutor de todo esse moderno processo de formação de caixa 2 que ainda norteou, em 2002, a primeira eleição de Aécio Neves para o governo de Minas Gerais. O dinheiro gerado em Minas se espalhava pelo País.

Nada pode ser entendido se for descartado, por exemplo, o livro O Voo do Tucano, do deputado petista Durval Ângelo, publicado em 1999. Praticamente circunscrito ao fechado mundo mineiro, onde tudo acontece e nada transpira, a obra ganhou alguma notoriedade na CPI dos Correios (2005), após as denúncias de Roberto Jefferson.

Valério era somente consultor financeiro quando se envolveu no processo de salvação da empresa de publicidade SMP&B. Por intermédio dele, o hoje senador Clésio Andrade aportou recursos na agência. Integrante, como vice, da chapa de Aécio Neves, ele repassou as ações para Valério numa operação cuja legalidade é discutida.

A sequência dessa história, que passa pela famosa Lista de Furnas, que a mídia tentou desqualificar, é conhecida e comprovada pelo advogado Dino Miraglia Filho, uma voz sem repercussão em Belo Horizonte.

Miraglia se ofereceu como assistente do Ministério Público na ação do mensalão tucano. Ele articula a esse processo a figura controvertida de Nilton Antônio Monteiro e a complexa história do assassinato de uma modelo que transitava com desenvoltura pelos caminhos abertos pela elite política e empresarial de Belo Horizonte.

Miraglia é um acusador implacável e que não usa meias palavras quando trata do que chama de “crimes de corrupção praticados pelos ocupantes do governo de Minas desde 1987 e que perduram até hoje”. Ele não sonega nomes: Eduardo Azeredo, hoje deputado, ex-governador de Minas, e Dimas Toledo, ex-presidente de Furnas, ambos envolvidos na construção de caixa 2 na campanha de Aécio Neves.

“Diante da robustez das provas e após perícias que comprovaram serem autênticos os documentos apresentados por Monteiro, o grupo criminoso montou um riquíssimo esquema jurídico e midiático para desacreditá-lo perante a opinião pública”, argumenta.

Miraglia tem em seu poder “muitos originais” aguardando a intimação do STF para depositar no cofre da secretaria, especialmente o documento aqui reproduzido parcialmente. Os tucanos, na ausência de barba, devem botar o bico de molho.


05 novembro, 2012

Pânico ou penico?

por Denise Queiroz
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Vi um pedacinho de um desses programas pânico ou cqc junto com o filho quando em 2007, de volta ao Brasil, pediu para assistir pois os colegas tinham falado. Não aguentamos nem 10 minutos e ele, à época com 10 anos, encontrou melhores companhias na escola.

Não é difícil que uma criança entenda que determinadas coisas não servem. Basta que os valores maiores tenham sido sempre colocados, desde a barriga. Boa música, brincadeira de folhear livrinhos de pano quando eles começam a segurar objetos, livrinhos de plástico no banho. Em vez da TV ligada da manhã à noite, alguns dias e horários para ver alguns filmes e, à medida que vão crescendo, programas escolhidos. Na hora de dormir, livros, histórias, música. E pronto. TV passa a ser como qualquer outro eletrodoméstico, só ligado quando necessário.

Mas por diferentes razões, a prática é outra. Gerações de seres humanos foram e são criadas na frente da TV, em casas que reproduzem cenários de programas daquele tipo onde tudo é muito arrumadinho e livro, papel, é visto como ‘coisa que enfeia e junta poeira’. E onde a televisão tem lugar de destaque e está sempre ligada, em qualquer canal...

No estudo da comunicação, várias teorias norteiam a análise do que funciona, e do que não, na hora de atingir o público. Sem entrar no detalhe, a terrível “uma mentira repetida mil vezes se torna verdade”, sintetiza boa parte delas. Isso em termos de notícia, né? Não só. A ficção e alguns programas com grande aceitação, se encarregam de disseminar algumas ‘verdades’ e hábitos que, mil vezes transmitidos sob variados personagens e cenários, acabam sendo incorporados, tanto por quem tem acesso à cultura formal – e boa parte a mal utiliza – quanto por quem não a tem. A maldade, na ficção, está na propagação massiva de estigmas sobre a condição de quem sempre esteve em situação vulnerável diante da cultura dominante.



Um exemplo recente, e revoltante, da incorporação e disseminação de valores nada edificantes, foi vivido nas redes sociais por Thiago Ribeiro e pode ser lido no seu blog. O vídeo que contava detalhes do odioso caso foi retirado do youtube, por decisão judicial que favoreceu ao agressor, um dos apresentadores de um desses programas que difundem preconceito sob o disfarce de humor.

Outros desses valores adulterados, de igual perniciosidade e com efeito danoso imediato, apareceu cerca de uma semana antes dos segundo turno das eleições. Um assessor de mídias sociais do candidato José Serra, pelo twitter e facebook, levava os seguidores a crer que o Enem deste ano havia sido cancelado. Porém, ‘espertamente’, linkando notícia de 2009, quando o exame foi fraudado numa gráfica da Folha de São Paulo



Print de hashtag no twitter. Esse perfil hoje
aparece como inexistente

Sábado, poucas horas antes da prova, nova onda de boatos sobre o cancelamento do exame chegou via twitter. Foi iniciado na noite anterior e os retuitadores da infâmia, apanhados, passaram o dia tentando justificar como “uma brincadeira”. 





Que tipo de sociedade é capaz de gerar pessoas tão insanas a ponto de tentar prejudicar, direta e imediatamente, quase seis milhões de pessoas ? E pior, uma vez expostos, a negar a gravidade dos seus atos?

Sabemos todos que este país é formado por centenas de influências culturais e os primeiros colonizadores eram muito mais 'amigáveis' ao ‘diferente’ que os de outras sociedades, como a norte-americana. Aqui houve miscigenação de etnias e povos, e a pluralidade cultural advinda disso é festejada como uma das nossas maiores riquezas. Mas isso  nunca impediu que o racismo, e outras doenças sociais resultantes do preconceito, existam e sejam evidentes. Tanto que há leis, desde a década de 50 do século passado, prevendo punição aos preconceituosos.

Agora as políticas afirmativas, implantadas na última década, começam a desenhar uma equiparação social que poderá ser contemplada em alguns anos mais. Elas vêm acompanhadas da luta diária das minorias, que de minoria tem muito pouco. A visibilidade nas redes sociais desses movimentos interconectados, a difusão de leis existentes e projetos de novas leis e as ações para diminuir os efeitos do preconceito, seguem a bons e largos passos. 


Evidente que, como toda ação gera reação, é exatamente o inconformismo da parcela de brasileiros que rejeita com o fígado uma sociedade mais igualitária, o que vem sendo despejado, disfarçado de ‘humor’ nos veículos e programas de massa, e muito mais claramente nas redes sociais.

A produção, e midiatização, desses conceitos excludentes é cada vez mais anacrônica: ao atender uma parcela social pouco identificada com os valores da maioria dos brasileiros, a rejeição é imediata pelas redes. E pelas urnas. Ano após ano, há perda de espaço de representação política do tipo de governança que não leva em consideração as legítimas demandas e os evidentes avanços trazidos pela inclusão educativa, econômica e social de milhões de pessoas historicamente à margem.
 

O resultado natural esperado é que o rechaço, já existente na  política e nas redes, se estenda às aberrações do entretenimento. 
A tendência é que por falta de público e, por consequência, de patrocinadores, estes programas desapareçam da grade diária e passem a servir, unicamente, como objeto de estudo de um fenômeno cultural temporal... que tentou ser implantado, mas que acabou não tendo importância na formação do país. 

A regulamentação do capítulo das comunicações da Constituição de 1988 poderia abreviar esse tempo, e evitar muito gasto de energia, tanto dos movimentos sociais quanto dos próprios agentes do Estado.

Enquanto isso não acontece, deixemos que tais programas, e quem está adiante e por trás deles, ocupem seu verdadeiro lugar: o penico.


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