13 julho, 2013

A guerra cibernética começa no seu smartphone



Por Alberto Dines 
Do Observatório da Imprensa

Quanto mais firmes forem os protestos do governo brasileiro, melhor. Quanto mais numerosas e abrangentes forem as iniciativas contra o governo dos Estados Unidos e suas contratadas pela invasão do nosso espaço cibernético, mais protegidos nos sentiremos.

A aterrorizante verdade é que apesar do nosso esperneio muito pouco poderá mudar. A Casa Branca dará todas as explicações, os organismos internacionais prometerão sistemas menos vulneráveis à intromissão externa do tráfego digital dos países, porém na melhor das hipóteses ficaremos mais conscientes e atentos à caprichosa marcha do progresso.

Nem mesmo o bravo Edward Snowden – ex-consultor dos serviços de inteligência americanos que botou a boca no trombone para acordar o mundo – conseguiria sugerir uma forma de controlar o sistema de conexões chamado WWW, ou W3, impedindo-o de cometer o encadeamento de abusos contra as soberanias individuais e nacionais.

Este maravilhoso sistema ao qual estamos conectados a partir das células eletrônicas que carregamos nos bolsos & bolsas é simplesmente indestrinçável. Impossível “desligar” a indústria das conexões, ela foi longe demais, não há retorno. O caos criativo está ganhando mais uma parada.

De bandeja

A humanidade fez uma escolha há cerca de duas décadas e agora está pagando o preço. Maravilhada com a mágica das redes onde máquinas falam com máquinas e superam todas as barreiras do tempo e do espaço, a comunidade humana apostou cegamente no confortável conceito de conectividade e comunhão instantânea. Com elas turbinamos um inesgotável acervo de ferramentas para viver melhor e saber mais enquanto anulam-se progressivamente as liberdades e arbítrios individuais. Com elas vamos às ruas para mudar o mundo, embora conhecendo apenas alguns de seus fragmentos.

Snowden, o homem mais solitário do mundo, o superexpatriado e hipermarginal, deveria ganhar o Nobel da Paz por ter arrancado de Vladimir Putin a confissão de que a Rússia é parceira dos EUA, por isso não pode conceder-lhe o asilo.

Não existem sociedades mais diferenciadas do que a ex-URSS e os EUA – no entanto, são parceiras. O adjetivo, em qualquer idioma, é sinônimo de sócio e cúmplice.

Putin e Obama estão enredados na mesma rede. Assim como as lideranças da China, da Alemanha, Reino Unido, Índia e Brasil. E também nós, comuns mortais, como constata Vikas Bajaj no New York Times (16/6):

“Os usuários trocaram privacidade por conveniência... Poderiam fazer um esforço para se defender, mas nenhum programa ou serviço pode protegê-los da intrusão de agentes do governo, criminosos ou hackers. O problema é que aos poucos cedemos coletivamente nossa privacidade à medida em que transferimos interações sociais, econômicas [e agora políticas] do contexto físico para o âmbito da e-nuvem alimentada por milhares de computadores gerenciados por empresas como Google, Amazon e Facebook. E será muito difícil, senão impossível, recuperar aquilo que desperdiçamos” (ver íntegra aqui, em inglês).

Trincheiras cibernéticas

A revelação do Globo no domingo (7/7) sobre a espionagem de milhões de e-mails e ligações [telefônicas] de brasileiros pelos EUA causou justificado frisson internacional. O Brasil é o mais monitorado país da América Latina, dizia o subtítulo. Teria sido muito oportuno lembrar que é, igualmente, o mais informatizado do subcontinente.

No mesmo domingo, à noite, no Fantástico da Rede Globo, o veiculador do alerta de Snowden, o jornalista Glenn Greenwald, do Guardian, explicou que o Brasil funciona como “ponte” para acessar outros países:

“Pode ter sido uma alternativa encontrada pelos programas de monitoramento norte-americanos para conseguir acesso aos sistemas de países mais protegidos, como a China e o Irã. Não temos acesso ao sistema da China, mas temos acesso ao sistema do Brasil. Então coletamos o trânsito do Brasil não porque queremos saber o que um brasileiro está falando para outro brasileiro, mas o que alguém da China está falando com alguém do Irã”. (G1, 7/7, 22h33)

Este é um pormenor que teria sido mais útil se publicado ao lado das revelações iniciais. Não foi. O desajuste jamais será corrigido – esta é a lógica das bolas de neve e as bolas de neve são fofas apenas na aparência.

Greenwald acrescentou que o software Prism permite à Agência Nacional de Segurança americana (NSA) acessar e-mails, chats online e chamadas de voz dos serviços da Apple, Facebook, Google, Microsoft, YouTube, Skype, AOL, Yahoo e PalTalk.

São essas portentosas redes que juntam o feliz proprietário de um smartphone ou tablet com o sistema planetário de intrusões, espionagem, terrorismo e contraterrorismo. São esses formidáveis serviços e suas calorosas redes sociais que empurram o homem contemporâneo, o cidadão conectado, para as trincheiras da guerra cibernética cujas maiores vítimas já conhecemos: a mídia impressa, o hábito de ler textos maiores do que três parágrafos, a capacidade de referenciar e entender os conjuntos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Web Analytics