imagem: Váleri Baríkin |
por Alberto Dines
Não foi a “imprensa burguesa” a responsável pela prisão de 11 réus condenados pelo escândalo do mensalão no último fim de semana. Mesmo como desabafo indignado ou recurso retórico a denúncia é equivocada. Repetida pelos encarcerados que faziam parte da direção do PT na época em que o caso veio à tona, revela surpreendente inabilidade e falta de inspiração. A explicação de Henrique Pizzolatto, ex-dirigente do Banco do Brasil que escapou para a Itália, é mais lógica e pertinente – alegou ser vítima de um erro judiciário, queria um julgamento justo. Mandou-se.
A “imprensa burguesa” é culpada de inúmeros pecados, aberrações e desatinos, mas o fato de ser burguesa não é sua culpa: burguesa é a sociedade que a criou e sustenta. O país que lhe fornece valores e mentalidades é espiritualmente burguês. Mais do que isso: pequeno-burguês. Inclusive algumas de suas vanguardas.
O exemplo mais recente e dramático dessa insopitável vocação para o reacionarismo foi a tentativa de um grupo de astros da música popular de embargar a publicação de biografias não-autorizadas. O caso é antológico, paradigma da amnésia burguesa que esquece compromissos do passado em troca do sossego futuro.
Esse burguesismo incrustado nos recônditos do nosso inconsciente resulta das contradições de uma elite incapaz de perceber o seu papel. A submissão ao “rei” Roberto Carlos – ícone de uma pequena burguesia clerical e medíocre – é uma brutal exibição das confrarias e lealdades desprovidas de ideais, assentadas apenas em interesses.
Auto de fé
O próprio objetivo do mensalão – garantir um esquema de sustentação parlamentar na base de compra regular de votos – foi um desvio burguês, reacionário. O certo seria buscar apoios a um projeto de governo, reformista ou revolucionário, cujo sucesso seria a legítima moeda de troca. Pagar em espécie por alianças políticas é um aviltamento do qual só participa quem não acredita no contrato social nem nos deveres democráticos.
Ignorar a exemplaridade do caso do mensalão – pela esfera onde ocorreu, por suas dimensões e dinâmica – para concluí-lo levianamente seria uma opção permissiva, frívola, burguesa. Esta condição dolorosa, trágica, não pode ser abortada, descartada ou contornada. A catarse seria uma solução: se produzir gestos de grandeza, reforçar consciências e criar a noção de reparação.
O que confere à nossa imprensa um ar terrivelmente burguês, falacioso, algo cínico, é a sua irresistível compulsão para comportar-se como um auto de fé. Ou patíbulo. Deveria ser a arena – ou foro – de onde se descortinam, em toda a extensão, a generosidade e miséria da condição humana.
A “imprensa burguesa” é culpada de inúmeros pecados, aberrações e desatinos, mas o fato de ser burguesa não é sua culpa: burguesa é a sociedade que a criou e sustenta. O país que lhe fornece valores e mentalidades é espiritualmente burguês. Mais do que isso: pequeno-burguês. Inclusive algumas de suas vanguardas.
O exemplo mais recente e dramático dessa insopitável vocação para o reacionarismo foi a tentativa de um grupo de astros da música popular de embargar a publicação de biografias não-autorizadas. O caso é antológico, paradigma da amnésia burguesa que esquece compromissos do passado em troca do sossego futuro.
Esse burguesismo incrustado nos recônditos do nosso inconsciente resulta das contradições de uma elite incapaz de perceber o seu papel. A submissão ao “rei” Roberto Carlos – ícone de uma pequena burguesia clerical e medíocre – é uma brutal exibição das confrarias e lealdades desprovidas de ideais, assentadas apenas em interesses.
Auto de fé
O próprio objetivo do mensalão – garantir um esquema de sustentação parlamentar na base de compra regular de votos – foi um desvio burguês, reacionário. O certo seria buscar apoios a um projeto de governo, reformista ou revolucionário, cujo sucesso seria a legítima moeda de troca. Pagar em espécie por alianças políticas é um aviltamento do qual só participa quem não acredita no contrato social nem nos deveres democráticos.
Ignorar a exemplaridade do caso do mensalão – pela esfera onde ocorreu, por suas dimensões e dinâmica – para concluí-lo levianamente seria uma opção permissiva, frívola, burguesa. Esta condição dolorosa, trágica, não pode ser abortada, descartada ou contornada. A catarse seria uma solução: se produzir gestos de grandeza, reforçar consciências e criar a noção de reparação.
O que confere à nossa imprensa um ar terrivelmente burguês, falacioso, algo cínico, é a sua irresistível compulsão para comportar-se como um auto de fé. Ou patíbulo. Deveria ser a arena – ou foro – de onde se descortinam, em toda a extensão, a generosidade e miséria da condição humana.
Nenhum comentário:
Postar um comentário