por Denise Queiroz
Os centavos que levam milhões de brasileiros às ruas desde abril são apenas a ponta perceptível do quanto estamos distantes de um ideal de Estado Democrático de Direito. A maneira como a tarifa dos transportes coletivos é reajustada é só uma mostra. Por imediatamente influírem nas contas do fim do mês das famílias com renda baixa e que vivem nas periferias de metrópoles mal administradas, catalisaram a insatisfação que se estende a muitas outras áreas públicas.
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Os centavos que levam milhões de brasileiros às ruas desde abril são apenas a ponta perceptível do quanto estamos distantes de um ideal de Estado Democrático de Direito. A maneira como a tarifa dos transportes coletivos é reajustada é só uma mostra. Por imediatamente influírem nas contas do fim do mês das famílias com renda baixa e que vivem nas periferias de metrópoles mal administradas, catalisaram a insatisfação que se estende a muitas outras áreas públicas.
A forma nada transparente com que são definidos os reajustes, evidenciam
o quanto as manobras jurídicas são usadas, cotidianamente, em palácios
suntuosos que abrigam servidores públicos muito bem pagos pelo Estado (nós). Reflete a podridão de um sistema que raramente serve à maioria e sempre aos que, desde
muito antes de sermos um Estado, o usam em seu benefício.
Um somatório de fatos e injustiças praticadas pelos poderes que
deveriam zelar pela inclusão, justiça e mínima qualidade de vida a todos que, involuntariamente, sustentam a máquina estatal – os impostos são recolhidos por
uma bala ou um carro de luxo –, transforma-se facilmente em revolta ‘contra tudo
que está aí’. E não há argumentos racionais capazes de explicar que não é bem
assim, pois a cada dia fica mais evidente que só os 'elegidos' usufruem de benefícios que deveriam ser de todos. E isso acaba pondo em xeque o
que a maioria dos que tem mais de 40 anos viveram: a reconstrução da
democracia.
Embora o sistema eleitoral funcione e elejamos a cada dois anos
representantes, o que nos autorizaria a dizer que estamos num sistema democrático e vivemos plena cidadania ainda está longe de ser conquistado. O Estado ainda é um ente inatingível e os serviços mais básicos não são prestados
ou, o são com falhas tais que comprometem seu bom desempenho. A democracia e cidadania restritas a poucos momentos passam a ser conceitos abstratos, lindos nos discursos marqueteiros das campanhas, pouco palpáveis na prática.
Embora as exceções, quantos dos inquéritos minuciosamente
investigados e preparados por servidores bem intencionados chegam a um
julgamento em que a Justiça é realmente aplicada?
Desde a caixa preta das planilhas de reajuste das tarifas de
transporte, passando pelas indecentes emendas parlamentares - que na prática servem como
financiamento de campanhas para que os mesmos de sempre, quase todos péssimos representantes eleitos, continuem usufruindo de um Estado privatizado - até
a pena para o roubo de uma galinha ser aplicada com rigor em contraste aos habeas-corpus
para os grandes contraventores, expedidos em trajes íntimos durante a noite, a
sensação de injustiça é o que se sente.
Esse é nosso Estado de Direito. E não importa o partido de
plantão. A estrutura está podre na base. Estamos mais próximos de um estado
bárbaro do que de um democrático de direito, uma vez que o acesso ao que as
leis deveriam garantir, se restringe a uns poucos, os mesmos de sempre, aos que
fazem o mesmo jogo, ao podre. Aos que se negam ou tentam outra forma, a velha
desqualificação fulanizada se encarrega de jogar no lixo.
Tem horas que a vontade é ir morar no meio do mato, sem rádio e
sem notícia das terras ‘civilizadas’. Não mudaria nada, mas certamente viveria mais feliz, pois é muito triste constatar que o que levamos anos para tentar construir está sendo destruído, minuto a minuto, por acordos espúrios e pela falta total de um mínimo de ética de quem exerce o poder nas várias áreas desta república. E ainda regiamente pagos com o pouco dinheiro da maioria.
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