10 maio, 2012

Querido amigo Sócrates

Do CartaCapital
Por Afonsinho

Querido amigo Sócrates,

vamos continuar conversando. Não há de ser uma simples partida que pode interromper o nosso campeonato e o verso diz que a morte é a contingência do esporte da vida. Além do mais, “aqui na Terra estão jogando futebol (na Espanha? na Alemanha?), tem pouco samba, muito funk e rock’n’roll”. Mas o que me incomoda mesmo é a sensação de voltar no tempo, retroceder. No fim das contas, estão aí o Passe Livre e a Democracia Corintiana.




Foto: Sergio Goncalves Chicago/Flickr

O primeiro ainda que solapado pelos espertalhões de plantão e pela “bancada da bola” (como se pode admitir um bando de cartolas inescrupulosos ser chamado assim?). A segunda é um avanço, com a diferença de ser incontestável, porque ganhou também dentro do campo, nas famosas quatro linhas, e não existe argumento a ser invocado. Está aí um tema que podemos continuar comentando: concentração é cárcere privado?

Das suas preocupações, muitas continuam nos castigando: Fifas, CBFs etc. A Copa do Mundo, com todos os seus problemas, nos aperta contra a parede do tempo. Agora a boa-nova. Ganhamos um guerrilheiro da área. O baixinho Romário tem aproveitado bem as brechas e marcado golaços no Congresso. Temos estimulado os esportistas, não só do futebol, que detêm mandatos políticos a se unir a favor do esporte (aí sim uma bancada da bola). Lembra da nossa campanha na Constituinte?

Uma inédita. Por estes lados volta-se a “discutir” as Malvinas. Na cabeça de quem pode caber em nossos dias, se é que algum dia coube na cabeça de alguém, algum direito da Inglaterra sobre a região? O argumento final para se advogar esse absurdo, imagine, é o fato de as Malvinas terem sido colonizadas pelos ingleses. É um escárnio. Se a ONU não é capaz de decidir uma questão dessas, vamos mal. Nada de bravatas, militarismo desnecessário, no máximo uma indenização por benfeitorias e tchau.

Em matéria de futebol, a temperatura anda nas alturas, decisões por todo o Brasil e final da temporada europeia. De uma tacada só foram para o espaço Palmeiras e Corinthians. Perderam para a dupla campineira Ponte Preta e Guarani. Logo depois, o Santos derrotou o São Paulo e vai encarar o Guarani, que venceu a Ponte. No Rio, o Botafogo desbancou o Vasco, ganhou a Taça Rio e vai para a final contra o Fluminense.

No Velho Mundo, o Barcelona perdeu melancolicamente para o Chelsea, depois de estar vencendo por 2 a 0 num jogo feio de ataque e defesa típicos de time grande contra pequeno, em que às vezes ganha o Davi. Nesse jogo, o Barça sofreu um gol “messiano” do nosso Ramires. Já o argentino perdeu um pênalti e outro gol de pelada que mostrou um Barça desintegrado.

Ramires lembra a todo o momento o grande Moacir, que rivalizava com Didi a camisa 8 do Brasil antes da Copa de 1958. Jogava no Flamengo com arte e, em seguida, foi para o Equador, onde vive. Anda muito doente. Sempre trabalhou modestamente naquele país, a ensinar o maravilhoso futebol da geração de ouro.

Parece que estamos pela gota d’água. Na ânsia de “fazer dinheiro”, o futebol realiza vários torneios ao mesmo tempo, as datas se atropelam e grandes clássicos, a exemplo do Fla-Flu de tanta tradição, às vezes acabam esvaziados porque os treinadores dão prioridade à Libertadores e usam times reservas.

Onde há alguma organização de classe ainda existem férias respeitadas e tudo o mais. No futebol, os jogadores têm o descanso encurtado e começam a jogar antes da hora, em pré-temporadas mal organizadas.

No campo e fora dele, a violência. Os jogos lembram A Noite dos Desesperados: correria desenfreada, bolas perdidas a cada 5 metros e muitas vezes choques entre atletas do mesmo time.

Meu prezado, lembro-me da sua crônica explicando a sempre presente discussão sobre o crucial pênalti. É pior para o goleiro ou para o batedor? É falta de treinamento?
É justo ou correto decidir-se um título mundial por um único jogador? Mais um papo bom para a roda de amigos

E por falar em papo de amigos, todos andam preocupados com a Seleção. Acho que podemos ter um bom time em 2014, mas é uma irresponsabilidade o Brasil não ter um time-base a dois anos da disputa e com uma Copa das Confederações no meio. Enterrar a mágoa da Copa de 1950 será difícil. A CBF continua a apostar em um projeto formalista, engessado, que deu muito errado no último Mundial.

Amigo, as coisas vão acontecendo sempre e de vez em quando eu contarei as novas. Pois como insiste o poeta, “eu continuo aqui mesmo…”

Um abração e saudades,
Afonsinho

P.S. Obrigado, muito obrigado, Chico Anysio, quando no auge da pressão que eu sofria no Botafogo (impedido de receber material para treinar), numa de suas passagens por General Severiano em companhia do grande Nilton Santos, ter sido carinhoso comigo e aberto meus olhos para a maldade dos dirigentes. Suas palavras amigas muito me ampararam e foram lições de vida para o jovem que eu era então.

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