26 maio, 2012

Professores, estudantes e funcionários pedem Comissão da Verdade na USP



Por Fábio Nassif
Do Carta Maior

São Paulo - O Pátio das Arcadas da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo foi palco do ato de lançamento de um abaixo-assinado para instalação da Comissão da Verdade na universidade. A atividade encabeçada por juristas nesta quinta-feira (25) lembrou que a USP foi uma das universidades em que os trabalhadores e estudantes foram mais perseguidos durante a ditadura, e que, por guardar resquícios regimentais daquele período, é uma das universidades que têm demonstrado enorme truculência diante dos movimentos lá organizados.

A ideia do Fórum Aberto pela Democratização da USP, que reúne representações dos três setores, organizações políticas e entidades de direitos humanos, é somar assinaturas até o mês de agosto, eleger possíveis membros nas bases de cada um dos setores da comunidade uspiana e protocolar oficialmente o pedido de instalação de sua Comissão da Verdade no conselho universitário.

Formado na USP, Fábio Konder Comparato disse que a Comissão da Verdade nacional deve ser ajudada por comissões estaduais, municipais ou setoriais, como é o caso da universidade. Em sua opinião, a comissão da USP deve trabalhar com total independência. “Os professores, estudantes e funcionários da USP devem abrir o passado e verificar tudo aquilo que ocorreu durante o regime empresarial-militar”, disse o professor.

“É preciso que nós saibamos enfrentar esta verdade difícil que é a verdade do desrespeito sistemático à dignidade da pessoa humana”, afirmou Comparato, que também criticou a repressão na USP dos dias atuais. “O regime disciplinar da universidade que continua em vigor foi estabelecido em 1972. Para os jovens isso pode não significar nada. Para nós que vivemos aquele período, significa o período mais sangrento do regime empresarial-militar. Era o Governo do general Médici”, disse, reforçando o papel da memória para não repetição do passado.

O professor de direito penal, Sérgio Salomão Shecaira, afirmou que “a Comissão da Verdade propiciará, no âmbito da USP, sabermos quem é que foi cassado pelo AI-5 e por que o decreto 477 permitia afastamento de estudantes”. “Esse decreto tem ainda um entulho autoritário que é uma cópia – me perdoem – cuspida e escarrada do 477, que é de 72, e que permite os detentores da USP processarem alunos da nossa universidade”, disse. Atualmente, 51 estudantes estão sofrendo processos administrativos e podem ser “eliminados”, de acordo com o regimento da USP.

O atual reitor da universidade, João Grandino Rodas, foi diretor da Faculdade de Direito antes de assumir o atual posto. Shecaira acredita que “este é um momento de retrocesso no seio de órgãos de poder da universidade”, e repetiu aos jovens presentes na plateia que “para nós, o Magnífico reitor será sempre persona non grata”.

Outro professor da casa, que não viveu os tempos sombrios do regime militar na USP mas é muito presente nas atuais mobilizações, Jorge Luis Souto Maior, elencou uma série de medidas a serem adotadas para que a universidade altere seu curso autoritário. “Devemos exigir a imediata retirada dos processos administrativos a servidores e alunos; o cancelamento do convênio com a Polícia Militar – que instaurou a lógica da repressão militarizada no campus -; a revogação imediata do atual regimento e construção de uma universidade verdadeiramente democrática – iniciando pela eleição democrática para reitor – atingindo a construção de um projeto verdadeiramente público com o fim do vestibular; a eliminação das fundações de direito privado; fim da segregação, derrubada de todos os muros físicos e sociais, como a criação de cotas raciais”, disse, arrancando aplausos dos participantes. “Se não fizermos isso, corremos o risco de acordar pela manhã e nos depararmos novamente com um ato institucional número 6, 7 ou 8 no diário oficial”, disse o jurista.

O procurador do Estado, José Damião Trindade, seguiu a mesma linha de raciocínio. Ele reforçou, no entanto, os atuais protestos da juventude entorno da reivindicação por memória, verdade e justiça. “Nos últimos 20 anos, com frequência, ao me dirigir a uma plateia como essa, em regra eu falava pra pessoas da minha idade ou um pouco mais novas. Mas nos últimos anos há uma novidade. Há um rumor neste país, sem rumo claro. Começa a tremer sobre os pés daqueles que participaram da ditadura, torturaram, sequestraram, mataram, estupraram nos quartéis e delegacias de polícia”. “Se os ditadores nos julgavam mortos ou acovardados, enganam-se. Estamos vivos e mais fortes porque agora estamos com os jovens combatentes”, disse emocionado.

O ato contou também com a presença de representantes do Diretório Central dos Estudantes (DCE Livre da USP), Associação dos Docentes da USP (ADUSP) e Sindicato dos Trabalhadores da USP (SINTUSP), além de outros coletivos. O atual diretor da Faculdade de Direito, Antonio Magalhães Gomes Filho, também participou e declarou apoio à instalação da comissão. Um lançamento da campanha pela Comissão da verdade na USP no campus Butantã está previsto para ocorrer na semana do dia 11 de junho.

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