20 dezembro, 2011

Lições do passado

por Eduardo Guimaraens*
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Há alguns dias os jornalistas Rafael Guimaraens, Elmar Bones da Costa, Jorge Polydoro e Ayrton Centeno estiveram na FNAC da Avenida Paulista lançando e fazendo um debate de uma obra necessária aos tempos que vivemos, o livro Coojornal – Um Jornal de Jornalistas sob o Regime Militar. Necessária pois vivemos numa época em que em cada vez mais se discute as questões relativas à livre expressão e a possibilidade da sociedade ser ouvida sobre sobre os conteúdos que lhes é apresentado pelos veículos de comunicação. 



Para quem não sabe o Coojornal foi um dos famosos jornais chamados nanicos que proliferaram nas décadas de 70/80 que tinham missão intrínseca de driblar a censura imposta pelo Governo Militar e fazer chegar à população a informação que não era dada pelos grandes veículos de comunicação, que estavam censurados ou se impunham uma autocensura. Mais do que isso o Coojornal foi o produto principal de uma experiência de autogestão de uma empresa jornalística – a Cooperativa dos Jornalistas de Porto Alegre – que teve em seus quadros cerca de 450 profissionais espalhados pelo Brasil. O Coojornal e Cooperativa duraram até 1983 e sucumbiu após a prisão de quatro de seus jornalistas e a falta de dinheiro, já que o Governo Militar em seus estertores promoveu um grande pressão sobre os anunciantes que mantinham a projeto. E após a decretação de sua falência, a Justiça Estadual do RS colocou uma pá de cal no pouco que restava da Cooperativa, a sua memória. Um juiz ordenou que os arquivos de fotos e matérias, que estavam num depósito da Justiça, fossem incinerados para liberar espaço. 


Os Anos de Chumbo passaram e o Brasil voltou a ser um país pleno de direitos, mas a propalada liberdade de imprensa não veio.

Hoje mídia é dominada por empresas jornalísticas que cresceram à sombra do Governo Militar sendo subservientes a ele e aos grandes conglomerados econômicos formando um oligopólio composto por poucas famílias. O que vemos é um jornalismo pautado por interesses de grupos conservadores e partidos de direita. E que nos últimos nove anos, devido à fragilidade dos partidos de oposição estes grupos arvoraram-se o direito ser a única oposição aos bem-sucedidos governos da coalizão liderados pelo Partido dos Trabalhadores.

Hoje o que temos é uma imprensa corporativa em seus interesses e que apresenta um produto de pouca qualidade e que dá pouco ou nenhum espaço para o debate de ideias. Episódios recentes como o que ocorreu nas eleições presidenciais e a oposição ferrenha ao Governo Dilma Roussef mostram claramente o caráter revanchista e odioso dos barões da mídia tupiniquim.

Não é exagero dizer que em referência à chamada grande mídia vivemos dias tão obscuros como os dos Anos de Chumbo. Fatos graves como a invasão da USP pela Polícia Militar e a consequente expulsão de seis alunos, com base em um Estatuto do Regime Militar, foram tratados de forma superficial pelos veículos de comunicação e nada foi falado do caráter ditatorial da atuação do atual reitor da USP, José Grandino Rodas.

E é por estes fatos é que há a necessidade de discutir temas como a democratização da mídia e uma Lei que regule os meios de comunicação.

Como disse o jornalista Franklin Martins, ao qual faz coro o sociólogo e jornalista Venício Lima, as normas e princípios para a democratização da mídia já estão na Constituição Federal, sobretudo no §5º do artigo 220, que diz expressamente que “os meios de comunicação social não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio”, e no “princípio da complementaridade” dos sistemas privados, público e estatal de radiodifusão, inserido no artigo 223, como critério a ser observado para as outorgas e renovações das concessões desse serviço público. Só que, como todos sabemos, essas normas e princípios não foram regulamentados pelo Congresso Nacional, e, portanto, não são cumpridos.

Lembra também Venício, em um artigo publicado no site do Observatório da Imprensa, que, “democratizar a mídia, portanto, seria viável apenas por meio de políticas públicas que garantam a regulação do mercado das empresas de mídia (a não oligopolização), vale dizer, basicamente, a concorrência entre as empresas que exploram o serviço público de radiodifusão e/ou as empresas de mídia impressa (que publicam jornais e revistas). E mais: estimulando a 'máxima dispersão da propriedade' (Edwin Baker) através da criação e consolidação de sistemas alternativos de mídia – públicos/comunitários”.


A história do Coojornal é um exemplo a ser seguido por aqueles que almejam e buscam o direito de se informar e debater os temas importantes deste Brasil liberto do regime autoritário do passado e que vem buscando a justiça social e o desenvolvimento econômico. 

Em tempo o livro Coojornal – Um Jornal de Jornalistas sob o Regime Militar está no catálogo das principais livrarias do país e o preço é R$ 40.
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*Eduardo Guimaraens (@justdu) é jornalista e trabalha no Jornal do Cambuci/Aclimação
Outros posts do autor: Linha cruzadaCaso Folha X Falha pode abrir precedente perigoso, O desmonte do discurso da velha imprensa (híbrido do Edu e desta que vos posta) 

4 comentários:

  1. Oligopólios no mercado comprometem a economia; oligopólios na mídia inviabilizam a democracia.

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  2. O passado nunca passa de todo. Vestígios e efeitos continuam escondidos para serem desvelados e, nesse processo, iluminar nossa compreensão. Parabéns pelo post.

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  3. Bem me lembro do Coojornal. É capaz até de ter alguns números guardados. Vou procurar... Mas isso e importante: "E é por estes fatos é que há a necessidade de discutir temas como a democratização da mídia e uma Lei que regule os meios de comunicação."

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